Empresas se comprometem com a descarbonização por conta própria

Apesar do atraso do governo em regular um mercado de carbono, o setor privado se mobiliza para reduzir emissões

No Brasil, o ESG tem um longo caminho a percorrer. Até lá, o desafio vai ser entender quais iniciativas são pra valer e quais são apenas propaganda enganosa. Folhapress/Lalo de Almeida

Por Folhapress

Thiago Bethônico

BELO HORIZONTE

A Embraer prometeu ser neutra em carbono até 2040, mesmo ano em que a BRF, dona da Sadia e Perdigão, deve conseguir zerar suas emissões líquidas. Já a JBS antecipou para 2025 o objetivo de acabar com o desmatamento ilegal nas fazendas de seus fornecedores indiretos no Cerrado, Pantanal, Mata Atlântica e Caatinga, enquanto a Suzano pretende tornar suas metas climáticas mais ambiciosas.

Esses são exemplos de compromissos assumidos por empresas brasileiras para diminuir a pegada ambiental de seus negócios. Além de anunciados recentemente, todos eles têm em comum o mesmo detalhe: foram feitos de forma voluntária.

O Brasil não conta com um instrumento de precificação de carbono, como um imposto ou um mercado regulado, que obrigue setores poluentes a reduzirem suas emissões.

No entanto, algumas companhias têm se mobilizado por conta própria, respondendo à pressão de investidores, consumidores e parceiros internacionais, cada vez mais atentos às práticas ESG (ambientais, sociais e de governança, na sigla em inglês).

A Embraer, por exemplo, além de neutralizar o carbono de suas operações até 2040, prometeu investir em tecnologias para diminuir o impacto do setor aeronáutico, hoje responsável por cerca de 3% das emissões humanas de carbono no mundo.

“Estamos com o objetivo de reduzir as emissões relacionadas a nossas operações, assim como desenvolver produtos mais sustentáveis e com menos impactos ambientais na nossa cadeia de valor”, afirmou o presidente da Embraer, Francisco Gomes Neto, durante evento de divulgação dos resultados trimestrais da companhia.

Na ocasião, Neto também disse que os alertas do relatório do IPCC (sigla em inglês para Painel Intergovernamental de Mudança do Clima da ONU) reforçam a urgência de lidar com a crise do clima. “A indústria de aviação tem um papel de liderança”, afirmou.

A situação ambiental apresentada pelo painel do clima também serviu de alerta para a Suzano, que pretende aumentar suas metas climáticas após a divulgação do IPCC.

Por ser de base florestal, a fabricante de papel e celulose já retira mais gases de efeito estufa da atmosfera do que emite. Agora, a companhia quer aumentar sua meta de sequestro de carbono, hoje estabelecida em 40 milhões de toneladas até 2030.

Recentemente, a Klabin, uma das principais concorrentes da Suzano, também divulgou novos compromissos ambientais. Um deles é reduzir suas emissões por tonelada de celulose, papéis e embalagens em 25% até 2025 e em 49% até 2035.

A fabricante conta com um estoque de quase 5 milhões de toneladas de carbono equivalente, que poderiam ser vendidos para empresas que querem compensar suas emissões. No entanto, a Klabin diz aguardar pela estruturação de um mercado de créditos.

“O que precisa ser desenvolvido é um mercado regulado. Isso sim pode trazer um impacto econômico importante para a companhia. Acho que os esforços, inclusive do Brasil, seriam muito bem-vindos”, diz Francisco Razzolini, diretor da Klabin.

Segundo a empresa, um mecanismo de precificação e comercialização traz mais transparência para as negociações, o que acelera a geração de créditos e proporciona mais benefícios socioambientais.

O setor de petróleo também tem se movimentado rumo à descarbonização. A SBM Offshore, fornecedora holandesa de plataformas, está investindo em estruturas mais sustentáveis e com baixa emissão.

“Nosso plano é o desenvolvimento de um FPSO [plataforma flutuante] EmissionZero, ou seja, com emissões nulas ou quase nulas”, diz Rafael Torres, diretor da SBM.

O programa, segundo a empresa, ainda prevê iniciativas para captura de carbono da atmosfera, uso de energia renovável e armazenamento de hidrogênio.

A SBM também mira na transição energética para fontes renováveis. Um dos projetos envolve a implantação de turbinas eólicas no mar, outro prevê a geração de energia por meio das ondas dos oceanos.

Além dos compromissos com a própria pegada climática, uma parte do setor privado tem se mobilizado para promover a descarbonização em regiões importantes do país.

Recentemente, a Abrace (Associação dos Grandes Consumidores de Energia e Consumidores Livres) desenvolveu um projeto para reduzir as emissões geradas pela produção de energia elétrica na Amazônia.

Como a região não está integrada ao sistema elétrico nacional, moradores e empresas dependem de fontes ainda muito poluentes, a maioria delas termelétricas que operam com óleo diesel.

A ideia da Abrace é substituir a geração fóssil por renovável, conectando painéis solares à rede de energia nestes sistemas isolados, a fim de diminuir a queima de diesel.

“A geração de energia elétrica na Amazônia é muito poluente, e é exatamente isso que a gente está tentando substituir”, afirma Paulo Pedrosa, presidente da associação.

Segundo ele, o projeto também tem apelo econômico, já que a produção de energia no bioma é mais cara, e o valor é subsidiado por todos os brasileiros.

“O custo final da energia chega a R$ 2.000 megawatt-hora, que é quase dez vezes o preço médio do sistema brasileiro. Enquanto o painel solar estiver produzindo, vamos trocar uma energia de R$ 2.000 por uma que está entrando de graça no sistema”, afirma Pedrosa.

De acordo com o presidente, o Brasil gasta R$ 8 bilhões por ano para subsidiar combustíveis fósseis na Amazônia.

Uma versão-piloto foi apresentada ao Ministério de Minas e Energia e está sendo avaliada pelo Procel (Programa Nacional de Conservação de Energia Elétrica).

“A Amazônia emite mais do que a média do Brasil, e até mais que a média da Europa, para produzir cada quilowatt-hora de energia elétrica. Então é algo que tem um apelo político, ambiental e econômico”, diz Pedrosa.

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