General Augusto Heleno sugeriu a censura das pesquisas eleitorais, por entrevistarem apenas parcela dos eleitores e em só parte das cidades; se a amostra for representativa, seu tamanho não é necessariamente um problema
Por Estadão
Doutor em Economia
“Todo general é patife” – alguém poderia afirmar ao lembrar a atuação dos militares na covid, no aumento dos seus salários, nos ataques à eleição. Mas essa é uma amostra viesada: há generais que não participam do governo e exercem suas funções com diligência e brio. Há ainda os que participaram do governo sem o mesmo oportunismo e poltronice.
Estatística, aliás, é conhecimento fundamental para um militar – mesmo nas funções civis. Permitiria negar que cloroquina deixe doentes zero-bala ou que a pandemia oferecesse risco de morte equivalente ao de nadar. A ignorância estatística foi tema aqui da coluna do Dia de Finados (Aman School of Management). Um leitor não gostou: tuitou que era vil e que nunca fiz nada de construtivo para o Brasil.
Na última semana, ele se insurgiu novamente contra a estatística. O general Augusto Heleno sugeriu a censura das pesquisas eleitorais, por entrevistarem apenas parcela dos eleitores e em só parte das cidades. O foco da crítica do chefe da inteligência é o tamanho da amostra, que deveria contemplar 156 milhões de eleitores e os “mais de 5.600″ municípios. Este último ponto seria o mais hercúleo para os institutos, que chegariam à Venezuela se procurassem a quantidade de municípios que ele imagina que o Brasil tem.
Pesquisas são, sim, vulneráveis a escolhas da amostragem: haveria viés, por exemplo, se incluísse só católicos (pró-Lula). Mas, se a amostra for representativa, seu tamanho não é necessariamente um problema.
Logo depois, Heleno comemorou a queda da inflação. Se surpreenderia se soubesse que não são contados todos os preços de todos os supermercados? O levantamento dos preços é amostral, assim como a escolha de quais produtos monitorar deriva de uma amostra. A celebração da queda no desemprego é outro caso em que o próprio governo usa o método, a partir da Pnad – ênfase no A (da sigla, que significa Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios).
Questionado, Heleno reagiu no Twitter: “Estudei estatística na Aman. Burrice não se inclui entre meus defeitos”. É porque amostras representativas permitem ler o todo que a Aman não exige milhares de questões no vestibular. Para provar o vinho, basta um gole. Para o bafômetro, um sopro. Para o exame de urina, um pote. Imagine não entender.
Pode ser que Heleno saiba estatística e aposte que burro é o militante. Porque o resultado das pesquisas pode ser o antídoto à eventual narrativa golpista contra as urnas. Mas não se as sondagens forem antes desacreditadas. Seu tuíte seria uma esperteza. Qual é o defeito do general?