Auditoria do TCU aponta que Bolsonaro tem que devolver 128 presentes que são patrimônio do governo

Procedimento focou nos presentes recebidos de autoridades estrangeiras; técnicos apontaram que 111 objetos não seriam de caráter personalíssimo, ao passo que outros 17 seriam de alto valor comercial

Sede do Tribunal de Contas da União.  Foto: Dida Sampaio/Estadão

Estadão

Uma auditoria feita pelo Tribunal de Contas da União (TCU) identificou 128 presentes de autoridades estrangeiras que estão no acervo privado de Jair Bolsonaro e que devem ser devolvidos para incorporação ao patrimônio da União. Os técnicos também apontaram falhas no processo de classificação dos presentes dados ao presidente da República e sugeriram medidas para evitar que elas se repitam. A auditoria foi feita em processo de relatoria do ministro Augusto Nardes.

O ex-presidente recebeu 9.158 presentes ao longo de seu mandato. Autoridades estrangeiras foram responsáveis por 295, dos quais 55 foram incorporados ao patrimônio da União. Outros 240 foram parar no acervo privado de Bolsonaro. Como revelou o Estadão, Bolsonaro recebeu de presente joias da Arábia Saudita e tentou resgatar dos cofres da Receita Federal antes de deixar o governo. O kit valioso fora apreendido quando um servidor tentou entrar no País com o presente escondido numa mochila.

Indícios de irregularidades levaram a Polícia Federal a investigar Bolsonaro, ex-assessores e pessoas próximas a ele por um suposto esquema de venda ilegal de presentes no exterior. Mauro Cid, ex-ajudante de ordens do ex-presidente, é um dos principais investigados. Ele está preso e fez uma proposta de delação premiada.

Dos 240 presentes que foram para o acervo pessoal de Bolsonaro, os técnicos do TCU avaliaram que 111 deveriam ter sido destinados ao patrimônio da União por não serem considerados de caráter personalíssimo. Até 2016, havia o entendimento de que apenas objetos ofertados em cerimônias oficiais deveriam ser incorporados ao patrimônio da União. Naquele ano, o TCU decidiu que apenas objetos de consumo imediato ou de ordem personalíssima poderiam ficar com os presidentes, como camisetas e bonés.

Segundo o TCU, outros 17 objetos que estão com Bolsonaro seriam de “elevado valor comercial” e também deveriam ser incorporados ao patrimônio da União. O relatório não cita quais seriam esses objetos. “Entende-se ser adequado considerar que a incorporação de presentes de elevado valor comercial ao acervo documental privado do ex-presidente, ainda que revestidos da característica de itens personalíssimos, está em desacordo com os princípios da razoabilidade e da moralidade pública”, diz a conclusão da auditoria.

Entre as proposições, a Corte de Contas pede que a Presidência da República reavalie os presentes que estão no acervo privado de Bolsonaro e instaure procedimento administrativo para identificar possíveis presentes que não tenham sido registrados. Também recomenda o aprimoramento das normas que regem os acervos documentais privados de interesse público dos Presidentes.

A incorporação de presentes de elevado valor comercial ao acervo privado do ex-presidente está em desacordo com os princípios da razoabilidade e da moralidade pública.”

Auditoria do TCU

Foram feitas análise de documentos, entrevistas e inspeção física na Diretoria Curatorial dos Palácios Presidenciais. O ex-presidente Bolsonaro respondeu a perguntas por meio de seus advogados.

A auditoria verificou que não houve registro no sistema de informações do Acervo Presidencial de um fuzil e uma pistola, entregues este ano à Polícia Federal após determinação do próprio TCU. Há menção a um par de brincos de ouro e uma bicicleta dados à ex-primeira-dama Michelle. Outros presentes já identificados pelo TCU também não teriam sido registrados. Foi o caso, por exemplo, do estojo de joias que ficou retido na Receita Federal, caso revelado pelo Estadão.

Segundo conjunto de joias recebido em visita na Arábia Saudita pela comitiva presidencial.  Foto: Polícia Federal/Divulgação

Chamou a atenção dos técnicos do TCU que um processo já havia sido realizado para incorporação ao patrimônio da União de um outro conjunto de presentes recebidos na mesma ocasião: o conjunto de relógio, rosário islâmico, abotoaduras, caneta e anel, todos em ouro rosé e cravejados de diamantes. Assim, os auditores dizem que o processo de registro dos presentes era tão falho que não só permitiu o registro com falta de informações, como também “permitiu o ingresso desses itens no Brasil sem evidências de que se tratavam de presentes ofertados ao país, pelo menos no momento da entrada na alfândega, o que resultou na apreensão dos bens pela Receita Federal”.

O relatório ressalta que não foram encontradas justificativas para a classificação entre acervo público (da União) e privado do ex-presidente. “A bem da verdade, os elementos coligidos aos autos permitem concluir pela inexistência de critérios na distribuição dos presentes recebidos entre os acervos público (patrimônio da União) e documental privado de interesse público do ex-presidente, tanto que em ambos os conjuntos se encontram itens de mesma natureza, como: camisas, quadros, vasos decorativos, porta-joias e esculturas”, diz o relatório.

Defesa

A defesa do ex-presidente foi procurada, mas não respondeu. O espaço está aberto.

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