Em 12 meses, IPCA avança 4,61%, e fica abaixo das projeções do mercado
O GLOBO
O Índice Nacional de Preços ao Consumidor (IPCA) subiu 0,23% em agosto após avançar 0,12% em julho, segundo dados divulgados pelo IBGE nesta terça-feira. O principal impacto sobre a inflação foi o aumento da conta de energia elétrica residencial, com o fim do “Bônus Itaipu”, desconto especial aplicado na conta de luz dos consumidores em julho.
Em agosto de 2022, ocorreu deflação de 0,36%. A prévia da inflação oficial, medida pelo IPCA-15, havia registrado alta de 0,28% em agosto.
Já é esperado que o índice em 12 meses volte a demonstrar força. Isso ocorre pela base de comparação fraca do ano passado, quando o IPCA teve deflação por causa da isenção de tributos de combustíveis, energia e telecomunicações às vésperas das eleições presidenciais.
— A trajetória do acumulado em 12 meses vinha de desaceleração até junho desse ano. A partir do momento em que começamos a substituir aquelas deflações de julho e agosto do ano passado no acumulado de 12 meses, ele acelerou tanto no mês passado quanto na passagem de julho para agosto — destaca o gerente da pesquisa André Filipe Guedes de Almeida.
O resultado do IPCA em 12 meses ficou acima do centro da meta estabelecida pelo Banco Central (BC) de 3,25% para 2023, mas dentro da margem de tolerância de 1,5 ponto percentual, para mais ou para menos.
Dos nove grupos de produtos e serviços pesquisados, seis tiveram alta no mês de agosto. O maior impacto positivo (0,17 ponto perventual) e a maior variação (1,11%) vieram de Habitação. Destacam-se, ainda, as altas de Saúde e cuidados pessoais (0,58%) e Transportes (0,34%).
No lado das quedas, o grupo Alimentação e bebidas caiu pelo terceiro mês consecutivo (-0,85%). Os demais grupos ficaram entre o -0,09% de Comunicação e o 0,69% de Educação.
Alta da energia elétrica
No grupo Habitação, a maior contribuição para o avanço do IPCA veio da energia elétrica residencial (4,59%), influenciada pelo fim da incorporação do Bônus de Itaipu creditado nas faturas.
Além disso, reajustes foram aplicados em quatro áreas: Vitória (9,64%), onde o reajuste de 3,20% teve vigência a partir de 7 de agosto; Belém (8,84%), com reajuste de 9,40% a partir de 15 de agosto; São Luís (7,03%), com reajuste de 10,43% com vigência a partir de 28 de agosto; e São Paulo (3,94%), onde o reajuste de -1,13% foi aplicado a partir de 4 de julho, em uma das concessionárias pesquisadas.
— O que mais influenciou o índice no mês de agosto foi a energia elétrica residencial. Tivemos o fim da incorporação do bônus de Itaipu, que havia sido creditado nas faturas emitidas no mês passado — disse Almeida.
No caso de Saúde e cuidados pessoais, a aceleração deve-se ao resultado dos itens de higiene pessoal, que passaram de -0,37% em julho para 0,81% em agosto. Houve alta nos preços dos produtos para pele (4,50%) e dos perfumes (1,57%).
No grupo dos Transportes, destacam-se as altas do automóvel novo (1,71%) e da gasolina (1,24%). Em relação aos demais combustíveis (0,87%), o óleo diesel subiu 8,54%, enquanto o etanol (-4,26%) e o gás veicular (-0,72%) caíram. Após a alta de 4,97% em julho, as passagens aéreas registraram queda de 11,69% em agosto.
Alimentação cai
A queda do grupo Alimentação e bebidas foi influenciada pelo recuo nos preços da alimentação no domicílio (-1,26%). Ocorreram quedas nos preços da batata-inglesa (-12,92%), do feijão-carioca (-8,27%), do tomate (-7,91%), do leite longa vida (-3,35%), do frango em pedaços (-2,57%) e das carnes (-1,90%).
No lado das altas, o arroz (1,14%) e as frutas (0,49%) subiram de preço, com destaque para o limão (51,11%) e para a banana-d’água (4,90%).
— Essa queda nos preços alimentícios tem sido influenciada por uma maior oferta desses produtos no mercado De maneira geral, a gente observa questões de uma maior oferta nessa época do ano, quando as temperaturas são mais amenas. Esses fatores climáticos acabam contribuindo também para aumentar a produção — explica Almeida.
Segundo o IBGE, nos últimos três meses, a alimentação em domicílio apresenta queda acumulada de 3,02%. O grupo alimentação e bebidas tem baixa de 1,96% no mesmo período.
A alimentação fora do domicílio (0,22%) registrou variação próxima à do mês anterior (0,21%), devido ao avanço do lanche (0,30%) e da refeição (0,18%). Em julho, as variações desses subitens haviam sido de 0,49% e 0,15%, respectivamente.
Segundo o IBGE, o índice geral de difusão ficou em 53% em agosto, sendo que de gêneros alimentícios somou 43% e não alimentícios, 61%. Em julho, de forma geral, ficou em 46%, com o índice dos alimentos em 38% e não alimento, de 53%.
Gasolina sobe 13% no ano
Segundo o IBGE, o preço da gasolina subiu 13,02% em 2023, até agosto, respondendo por 0,60 ponto percentual da taxa de 3,23% do IPCA acumulado em 2023.
Os outros itens com maior impacto para a inflação no ano foram o emplacamento e licença de veículos (13,64% e 0,34 ponto percentual), planos de saúde (8,24% e 0,31 ponto percentual), energia elétrica (7,35% e 0,29 ponto percentual) e ensino fundamental (10,63% e 0,15 ponto percentual).
Veja o resultado dos grupos do IPCA:
- Alimentação e bebidas: -0,85%;
- Habitação: 1,11%;
- Artigos de residência: -0,04%;
- Vestuário: 0,54%;
- Transportes: 0,34%;
- Saúde e cuidados pessoais: 0,58%;
- Despesas pessoais: 0,38%;
- Educação: 0,69%;
- Comunicação: -0,09%.
Leitura positiva, com continuidade no corte de juros
Para economistas, a leitura do IPCA foi positiva, especialmente pela continuidade da desaceleração na inflação de serviços subjacentes, variável observada de perto pelo BC. A divulgação consolida o cenário de cortes na Selic em 0,50 ponto percentual nas próximas reuniões, com a possibilidade de reduções maiores sendo limitada por fatores como o cenário externo negativo nas últimas semanas, atividade econômica ainda forte, e preocupações com o cenário fiscal.
A economista do Itaú Unibanco, Luciana Rabelo, destaca como positivo a desaceleração nos serviços subjacentes, que saiu de 0,20% para 0,14% e deve continuar a apresentar desaceleração nas próximas divulgações.
— Quando olhamos dentro de serviços subjacentes, surpreendeu para baixo alimentação fora do domicílio, alguns itens de recreação e de estética. A divulgação reforça um viés de baixa para esses serviços subjacentes.
Em suas últimas comunicações, o BC colocou o processo de desinflação de serviços como um dos fatores a serem observados para avaliar a sequência de cortes nos juros. Além disso, a autoridade monetária aguarda um nível de reancoragem maior das expectativas e observa a evolução da atividade econômica, que tem se mostrado mais resiliente do que o esperado.
— Mesmo com o cenário externo e o câmbio marginalmente piores, essa queda em serviços é bem positiva para a política monetária, que deve seguir em queda nesse ritmo de 0,50 ponto percentual – disse a economista-chefe do Banco Inter, Rafaela Vitória.
Para os especialistas, mesmo o recente aumento da cotação do Brent no mercado internacional e um desempenho pior do câmbio não devem impactar negativamente as leituras de inflação, tendo efeito sobre os ritmos de cortes da Selic apenas em 2024.
— O cenário externo pior vai impactar mais em 2024. Se o petróleo consolidar em US$ 90 ou eventualmente chegar em US$ 100, com o câmbio mais pressionado, podemos ter novas altas de combustíveis e uma interrupção do ritmo de quedas que está precificado hoje – destaca Rafaela.
A economista-chefe do Inter ressalta que outro fator que impede cortes mais agressivos nos juros são as preocupações fiscais, com as incertezas se o governo conseguirá cumprir as metas estabelecidas pela regra do acabouço fiscal. Caso haja sinais de que isso não irá ocorrer, poderá ocorrer uma deterioração nas expectativas.
— Vimos uma queda de arrecadação significativa em julho e devemos ter números ainda fracos em agosto. Isso traz preocupações sobre o cumprimento da meta. Cenários externo e preocupação com o fiscal impedem uma melhora adicional nas expectativas mais longas de inflação. Dificilmente, veremos um corte de 0,75 ponto percentual nas próximas reuniões.
O cenário do Itaú ainda segue de Selic a 11,75% ao ano, com cortes de 0,50 ponto percentual, mas o banco não descarta um aumento no ritmo das reduções.
A economista chefe da Armor Capital, Andrea Damico, avalia que após a divulgação ainda há espaço para redução de 0,75 ponto percentual para a reunião de dezembro.
— Acreditamos que essas surpresas com inflação vão gerar algum arrefecimento nas expectativas e, apesar da atividade ter surpreendendo positivamente no primeiro semestre, vislumbramos uma estabilização no terceiro e no quarto trimestres