Chefe da inteligência do governo do AM é preso em operação contra roubo de ouro ilegal

Ele é acusado de utilizar a estrutura de sua pasta para roubar ouro, provavelmente extraído de garimpos clandestinos.

O secretário executivo de Inteligência do governo do Amazonas, Samir Freire (centro), recebe o então secretário nacional de Segurança Pública, general Guilherme Theophilo (esq.) no Centro Integrado de Inteligência de Segurança Pública, em Manaus, junto com o secretário estadual de Segurança Pública, o coronel da PM Louismar Bonates – Secretaria de Segurança Pública do Amazonas/Divulgação

Por Folhapress

MANAUS, AM (FOLHAPRESS) – O secretário executivo de Inteligência do governo do Amazonas, o delegado da Polícia Civil Samir Freire, foi preso na manhã desta sexta-feira (9) em Manaus, durante operação da Polícia Federal e do MPE (Ministério Público do Amazonas). Ele é acusado de utilizar a estrutura de sua pasta para roubar ouro, provavelmente extraído de garimpos clandestinos.

Batizada de Garimpo Urbano, a operação prendeu outros três policiais civis do Amazonas e cumpriu dez mandados de busca e apreensão em Manaus, no interior do estado e também no Pará.

De acordo com a PF, a quadrilha de Freire monitorava e abordava transportadores de ouro ilegal “mediante uso de estrutura e pessoal da Secretaria Executiva Adjunta de Inteligência (Seai)”.

Um dos equipamentos utilizados é o Guardião, na prática uma enorme secretária eletrônica capaz de gravar conversas de números grampeados mediante autorização judicial. Polícias corruptos costumam solicitar monitoramento alegando que se trata de uma investigação, pratica conhecida como “barriga de aluguel”. Para prevenir o mau uso, o equipamento é 100% auditável.

Segundo o promotor Armando Gurgel Maia, do Gaeco (Grupo de Atuação Especial de Combate ao Crime Organizado), a mera presença do único Guardão do governo estadual na Seai configura irregularidade, já que os monitoramentos deveriam ser usados para investigação criminal, atribuição da Polícia Civil.

A investigação contra Freire começou em fevereiro, quando o MPE passou a receber denúncias de donos de garimpos achacados. Um deles relatou ter sido abordado em Manaus por cerca de 15 policiais civis e levado para a Seai. Ele foi liberado, mas o ouro foi roubado. Por ser propriedade da União, a investigação de ouro ilegal é atribuição da PF.

Somando apenas as quatro denúncias recebidas, os policiais teriam roubado 60 kg de ouro , segundo o Gaeco. O valor estimado é de R$ 18,3 milhões. As investigações, no entanto, indicam que Freire praticava esse tipo de extorsão desde 2019, ano em que ele assumiu a Seai.

Próximo do governador Wilson Lima (PSC), Freire é subordinado ao secretário de Segurança Pública do Amazonas, o coronel da PM Louismar Bonates. Os dois trabalham no mesmo prédio, em salas alugadas dentro de um shopping center de Manaus.

Em dois meses, é a segunda operação do Gaeco contra policiais acusados de achacar criminosos, prática conhecida como “arrocho”.

No início de maio, o Gaeco prendeu o tenente-coronel da PM Glaubo Rubens de Alencar, o investigador da Polícia Civil Acrísio Drumond de Carvalho e o ex-PM Wanderlan Fernandes de Oliveira. Eles teriam roubado 500 kg de maconha da facção criminosa Comando Vermelhor (CV). Os três foram denunciados por tráfico, roubo e organização criminosa.

Um mês depois, durante uma recente onda de ataques incendiários a ônibus e a prédios públicos em Manaus e em outras cidades do Amazonas, o CV divulgou um “salve” (comunicado) em que acusa Bonates de usar a estrutura da PM para extorquir droga, ouro e dinheiro de narcotraficantes.

Em entrevista coletiva, Gurgel Maia afirmou que, até o momento, não há conexão entre os casos de roubo de maconha e de ouro, mas advertiu que o Amazonas corre o risco de seguir o caminho do Rio de Janeiro, em referência à formação e expansão de milícias de policiais.

“É uma sucessão de eventos criminosos em que, infelizmente, há a participação de agentes públicos”, afirmou o promotor. “O que a gente não pode deixar acontecer é ficar a imagem de que é rentável agentes públicos formarem suas milícias particulares e degringolar em um esquema criminoso do qual hoje a população carioca hoje se ressente muito.”

Questionado sobre se o secretário Bonates está envolvido, Gurgel Maia não respondeu, alegando que a investigação corre em sigilo.

Em nota, Bonates afirmou ter determinado à Corregedoria a abertura de um processo “para julgar a permanência dos envolvidos na operação policial do MPE e PF nos quadros do sistema de segurança” e que irá colaborar com as investigações.

A prisão desta sexta-feira é mais um episódio de descontrole policial sob o governo Lima. Sob sua administração, a PM foi acusada de protagonizar três chacinas.

A primeira e mais violenta, no final de 2019, deixou 17 mortos no bairro Crespo, em Manaus, incluindo um adolescente de 14 anos assassinado com tiro no peito.

Na segunda chacina, ocorrida em agosto no rio Abacaxis, perto de Nova Olinda do Norte (AM), foram cinco mortos e três desaparecidos, em suposta reação ao assassinato de dois PMs. Por causa da truculência, a Justiça determinou que o governo federal oferecesse proteção a indígenas e ribeirinhos da região, ameaçados pelos policiais militares.

A terceira chacina ocorreu em Tabatinga (AM), entre os dias 12 e 13 de junho deste ano. Familiares e testemunham acusam PMs de terem torturado e executado ao menos seis jovens na cidade, em represália ao assassinato de um sargento.

O coronel Bonates já havia sido alvo de investigações da PF antes de se tornar secretário de Segurança Pública. Em 2005, interceptações telefônicas mostraram que ele era próximo a um grupo de extermínio comandado por outro PM, um amigo próximo.

Dez anos, depois, em 2015, quando era secretário de administração penitenciária, a PF descobriu que ele havia negociado com José Roberto Barbosa, o Zé Roberto da Compensa, um dos fundadores da facção FDN (Família do Norte), que chegou a dominar o Amazonas, mas acabou derrotada pelo CV.

Os indícios das investigações foram repassadas pela PF ao Ministério Público do Amazonas, que não formalizou nenhuma acusação contra o atual secretário. Bonates nega todas as acusações.

A reportagem entrou em contato com o advogado de defesa do delegado Freire, mas ele afirmou que não faria declarações no momento. A reportagem não encontrou representantes legais dos dois policiais e do ex-PM presos em maio.

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