Por Estadão
Em agosto de 1822, um cavaleiro com uniforme de soldado parou seu cavalo à porta dos fundos da recém-construída Fazenda Pau D’Alho, em São José do Barreiro, e serviu-se do almoço comendo no chão da cozinha. Como o senhorio esperava a comitiva de d. Pedro I, os empregados pediram que o estranho se apressasse com a comida, sem saber que estavam diante do próprio príncipe, que havia disparado seu cavalo à frente do séquito. D. Pedro estava a caminho do histórico local às margens do Ipiranga onde daria o grito da Independência, há 200 anos.
Essa história carece de registros oficiais, mas ajudou a fazer a fama da fazenda onde de fato as comitivas reais e imperiais costumavam se alojar em suas viagens entre a São Paulo da época e o Rio de Janeiro. Às vésperas do bicentenário da Independência, aumentou o fluxo de turistas para conhecer o local onde, segundo os relatos, d. Pedro I saboreou um prato de comida agachado no chão da cozinha.
Localizada no km 262 da Rodovia dos Tropeiros (SP-068), preservada e aberta à visitação, a Fazenda Pau D’Alho, foi construída na transição do século 18 para o 19 por João Ferreira. A casa-sede é hoje um dos raros edifícios que mantêm viva esta passagem histórica de d. Pedro pela região.
Apesar de não existirem registros de como foi essa passagem, o príncipe encontrou naquela visita uma construção imponente, de arquitetura militar, com a plantação de café já formada no entorno. “Na época era muito difícil pensar em acesso a alimento, mas a chegada de um príncipe requeria investimentos. Era um grande momento que exigia uma grande logística, apesar de se tratar de um homem de modos simples e de fácil relacionamento como pessoa. O fato é que as famílias tentavam fazer o melhor para receber o príncipe”, afirma Diego Amaro, historiador e escritor do Vale do Paraíba.
Além de um cenário da história da Independência no trecho que compunha a Trilha Real, São José do Barreiro foi um marco para a história do novo período, que marca o encerramento do ciclo do ouro e início do cultivo do café. A Fazenda Pau D’Alho, além de grande produtora cafeeira, era um ponto de referência para o abastecimento de viajantes, entre eles as comitivas reais. A região era forte também no cultivo de cana-de-açúcar e tabaco.
D. Pedro fazia visitas constantes à região, na divisa com o Rio de Janeiro, para evitar problemas com separatistas e formar alianças. O Vale do Paraíba, onde fica a cidade, passou a ter grande impacto econômico na época, não só por contribuir para sustentar o Segundo Império, mas para o início do novo momento do Brasil, a partir de 1822.
Atualmente, a fazenda está voltada para o turismo histórico, ajudando a compreender o Brasil de dois séculos atrás. A casa senhorial é um dos pontos de maior interesse para o turismo pedagógico na região. As visitas monitoradas são uma imersão nos diversos períodos da fazenda, desde sua construção, iniciada em 1792 e concluída em 1817, até os dias atuais.
Conforme a secretária de Turismo, Ana Paula Almeida, a cidade preserva patrimônios importantes da história paulista desde o período imperial até a Revolução de 1932. “A Fazenda Pau D’Alho é uma das mais expressivas, mas há outras fazendas históricas construídas nessa época que estão preservadas, dado seu valor histórico”, disse.
As visitas são de quinta-feira a domingo, das 9 às 16 horas e não precisa de agendamento prévio. A entrada é gratuita devido a uma parceria firmada em 2017 entre a prefeitura e o Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional (Iphan). Os 2,6 mil metros quadrados de construção incluem residência, cozinha e benfeitorias externas, até a senzala, que já tinha um outro formato no período próximo à abolição da escravidão, quando o acesso a escravos já era mais difícil.