Governo atual é o que mais cortou em recursos de Educação e Ciência

Levantamento do Observatório do Legislativo Brasileiro usa informações desde 1999, ano mais recente em que há dados federais sobre as verbas do MEC e do MCT

O MEC teve seu caixa zerado pela gestão Jair Bolsonaro (PL) e ficou sem recursos para pagar mais de 200 mil estudantes neste mês. Após pressão, o ministro da Educação, Victor Godoy, anunciou que os pagamentos de bolsas serão pagos até próxima terça-feira, 13. Foto: Dida Sampaio/EstadãoEstadão

Estadão

Além do baixo investimento, o governo Jair Bolsonaro (PL) também foi o que mais fez cortes nos ministérios da Educação (MEC) e da Ciência e Tecnologia (MCT) desde 1999, ano mais recente em que há dados no sistema federal. Os bloqueios ou contingenciamentos são feitos por meio de decreto presidencial e cancelam parte dos recursos previstos pelo orçamento anual. Nos últimos quatro anos, o MEC teve 20% de suas verbas cortadas e o MCT, 44%.

Os dados foram tabulados pelo Observatório do Legislativo Brasileiro (OLB), um núcleo de pesquisa ligado à Universidade do Estado do Rio de Janeiro (Uerj). Antes, o maior índice havia sido no segundo governo de Dilma Rousseff (PT) em que os cortes chegaram a 15% no MEC. No MCT, o recorde era na gestão de Michel Temer (MDB), com 29%.

Na Educação, só o valor bloqueado de 2022 ultrapassa R$ 40 bilhões, quase o dobro dos R$ 24 bilhões cancelados nos últimos três anos. Nos quatro anos de Bolsonaro, o orçamento total do MEC foi de cerca de R$ 566 bilhões e cerca de R$ 113 bilhões foram cortados. Já no segundo governo Lula, por exemplo, foram R$ 359 bilhões e R$ 21 bilhões, respectivamente.

Outro estudo do mesmo núcleo já havia mostrado que recursos reservados para investimentos em educação e ciência foram os mais baixos no Brasil desde os anos 2000. Os investimentos são recursos destinados para reformas em universidades e escolas, obras em laboratórios, compra de equipamentos, livros e para novas políticas públicas. O restante vai para despesas obrigatórias, como salários.

O MEC tinha este ano cerca de R$ 3 bilhões para investimentos, muito aquém de números entre R$ 10 bilhões e R$ 20 bilhões entre 2009 a 2015 (em valores corrigidos pela inflação). Segundo a nova pesquisa, entre as áreas mais afetadas por bloqueios está a Capes, que nesta semana foi impossibilitada de pagar mais de 200 mil bolsas justamente por um decreto presidencial.

Nesta quinta-feira, no fim do dia, após grande pressão, o ministro da Educação, Victor Godoy, anunciou que R$ 460 milhões foram liberados para a pasta e que as bolsas seriam pagas até o dia 13.

“Os cortes não são feitos em investimentos apenas, não é que se promete melhorar um programa e se volta atrás. São cortes em políticas que já existem e precisam ser mantidas, são despesas correntes”, afirma Joyce Luz, pesquisadora do OLB e autora do estudo. O contingenciamento, diferentemente de outros remanejamentos de verbas, não precisa de aval do Congresso.

Os cortes na Capes passaram de 9% em 2019, no início do governo de Jair Bolsonaro, para 28% este ano.

Nesta semana, notas divulgadas pela presidência do órgão mostram a falta de apoio da Educação às decisões da Economia nos últimos dias. “A Capes defenderá sempre a regularização dos pagamentos devidos aos alunos e pesquisadores (…), não apenas em razão de sua natureza alimentar, mas principalmente em respeito aos profissionais e pesquisadores que mantêm e desenvolvem a ciência brasileira, pelos quais a atual gestão da fundação nutre imenso respeito e admiração”.

“A gente está falando da subsistência dessas pessoas, de ter dinheiro para pagar aluguel, comida”, diz o presidente da Associação Nacional dos Pós Graduandos (ANPG), Rogean Vinícius Santos Soares.

Depois que o Estadão revelou que o caixa do MEC havia sido zerado, entidades estudantis entraram com uma ação no Supremo Tribunal Federal (STF) para exigir que fosse suspenso o decreto presidencial. O STF deu 72 horas, que terminam neste sábado, para que o presidente Bolsonaro preste esclarecimentos sobre o corte.

As bolsas de mestrado têm valor mensal de R$ 1,5 mil e as de doutorado, de R$ 2,2 mil, e estão desde 2013 sem reajuste. Outras áreas que sofreram cortes expressivos no MEC foram o Fundo Nacional de Desenvolvimento da Educação (FNDE), responsável por programas de merenda escolar e livro didático, com 32% dos recursos cortados em 2022, e as universidades federais, com 25%. Ambos são preocupações da equipe da transição do governo eleito.

Não há aumento do valor pago à alimentação dos alunos desde 2017. Em agosto, a gestão Bolsonaro vetou o reajuste, com correção pela inflação, aprovado pelo Congresso. A justificativa foi que isso poderia estourar o teto de gastos, mesmo argumento dado para os cortes agora.

No Ministério da Ciência e Tecnologia, o Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPQ), que financia bolsas de pesquisadores, foi um dos órgãos mais afetados por cortes, segundo o estudo. Entre 2019 e 2021, em média foram 68% das receitas canceladas. Em 2022, 40% do total.

Procurados nesta quinta-feira, o MEC e a pasta da Ciência e Tecnologia não comentaram o estudo. O Ministério da Economia disse que “os bloqueios resultam sempre de uma decisão colegiada, tomada no âmbito da Junta de Execução Orçamentária (JEO), levam em conta critérios como a dotação total de cada ministério e seus volumes empenhados, e ocorrem para cumprimento do teto de gastos, que é uma determinação constitucional”.

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