Atriz de ‘Salve Jorge’, da TV Globo, detalhou ao Estadão como descobriu estar em relacionamento abusivo e sugeriu solução para evitar namoros tóxicos
Estadão
Laryssa Dias viveu um relacionamento abusivo durante as filmagens da novela Salve Jorge, da TV Globo, transmitida entre 2012 e 2013, e se tornou vítima de violência doméstica. Em um relato comovente ao Estadão, ela disse que o namoro tóxico afetou seu trabalho e até hoje não soube como conseguiu terminar a trama, que demandava “muita atenção”. Seu objetivo com a entrevista era ter um alcance maior para “ajudar outras pessoas” em situações similares.
“Eu estava em um momento muito gostoso de trabalho, de conquistas e tudo mais, porque filmava a minha primeira teledramaturgia. Mas, no relacionamento, senti movimentos de competição e de inveja de quem deveria ser meu companheiro e aliado”, conta Laryssa.
O comentário diz respeito a um homem que ela conheceu por meio de amigos em comum e quem seria seu primeiro namorado sério. Sem um histórico familiar de violência doméstica, seja ela física ou psicológica, e com pais amorosos, Laryssa se viu vítima de uma pessoa manipuladora, mentirosa e agressiva por cerca de um ano e meio entre idas e vindas.
O início da relação
No começo do namoro, tudo era maravilhoso, conta ela. Aos 39 anos, quando olha para trás, a atriz reconhece alguns sinais de abuso, logo no início da relação. Porém, no auge dos seus 28 ela não percebia, o que foi, segundo a artista, por falta de amor-próprio, confiança, autoconhecimento e consciência.
“Quando olho hoje para aquela Laryssa, para aquela relação e para aquela situação que já tem quase 10 anos, vejo claramente que tinham vários indícios de abuso. Mas, é tudo muito confuso quando é você quem está dentro do relacionamento”, relembra ela sobre o início da relação.
Aos poucos, seu parceiro demonstrou comportamentos obsessivos e abusivos. Entre outros sinais, Laryssa percebeu que a culpa se tornava dela mesmo quando era ele o equivocado da discussão. A artista destacou uma história específica e simples em que ele tentou exercer controle sobre ela.
Um dia, Laryssa escutou o interfone do apartamento tocar, mas seu parceiro jurou que ela ouvira errado. A atriz entrou no banho questionando se o fato acontecera, e telefonou para uma amiga de longa-data para conversar sobre a situação. “Amiga, eu não estou louca. Eu sei o que ouvi”, confidenciava a artista na época.
Agressão física e o final da relação
Além dos insultos e manipulações, o silêncio também se tornou uma forma de punição. Na entrevista pelo Zoom, foi possível perceber que relembrar dos sumiços do parceiro e da agonia daquela época ainda angustiva Laryssa. Uma sensação que volta quase à tona conforme ela recria, lentamente, os acontecimentos de 10 anos atrás. “Não sei se é uma autodefesa”, pensa ela sobre a dificuldade de recordar.
Conforme a atriz relembra, ela chega no ponto final do relacionamento desaprovado pela família e amigos: o momento da agressão física no carro. Em um namoro muito desgastado, os dois desceram pelo elevador até a garagem do prédio onde estavam. Antes de saírem do condomínio, entraram no veículo e discutiram por um motivo o qual não se recorda. “Já tínhamos tido brigas piores do que aquela”, pontua.
Em um determinado momento, seu parceiro usou as duas mãos para enforcá-la por alguns segundos no banco. A atriz, hoje em dia, entende a atitude como uma tentativa de assustá-la e deixá-la com medo. Um dos objetivos dele seria fazer com que ela parasse de questioná-lo.
Em seguida, o namorado saiu do carro, pegou sua moto e foi embora. Sozinha, ela ficara em choque com o ocorrido. “Eu mesma não queria acreditar”, relembra a atriz, emocionada, antes de falar sobre a vergonha e a culpa que sentira. Por muito tempo, as sensações a impediram de contar para alguém sobre o perigo pelo qual passara. Na época, ela pensou que a agressão não fora “nada demais”.
O seu ex-companheiro tentou contato após o ocorrido, mas a artista o bloqueou em todas as plataformas e não atendeu mais suas ligações. Ainda na entrevista, Laryssa reafirmou o motivo pelo qual contou a sua história ao Estadão. “Penso na Laryssa de 10 anos atrás e como seria se eu ouvisse uma atriz, formadora de opinião, influenciadora falando sobre isso. Seria importante”, disse.
‘Meu Deus, como eu me permiti?’
A violência contra a mulher e o feminicídio ainda são temas muito presentes no Brasil. Segundo dados da Rede Observatório de Segurança, em 2021, os números gerais revelaram um pequeno aumento de 8% nos casos em relação a 2020. A pesquisa ainda registrou um caso de feminicídio a cada 12 horas no ano passado.
Aflita com essa realidade e com as notícias que vê do Brasil, Laryssa foi parte da estatística de violência contra mulher entre 2012 e 2013. Hoje em dia, ela evita se prender ao passado e busca destacar aprendizados da experiência. Desde então, aprendeu impor limites e reconhecer sinais de abuso em um relacionamento. “A gente se sente tão empoderada e dona de si quando diz ‘não’”, conta a atriz, que buscou ajuda profissional, familiar, espiritual e nas amizades para superar o namoro e se amar.
A solução para se afastar de relações abusivas, para ela, percorre esse caminho: construir confiança, criar amor-próprio, dizer “não” e buscar autoconhecimento. Esse passo a passo é necessário para entender qual vínculo afetivo faz sentido.
“Quanto mais você se apropria de quem você é, gosta de quem você é, cuida de você e aprende a se olhar e se respeitar, menos você vai se machucar, menos você vai se permitir, menos tempo você vai ficar em uma relação assim”, finaliza ela.
Ainda assim, Laryssa garantiu que ainda conhece e se associa com pessoas abusivas. O importante agora, porém, foi aprender a perceber, se defender, se amar e entender quando uma relação deve chegar ao fim. Isso, diz ela, é o que deseja para todas as pessoas em situações similares.