Ofensiva envolveu mísseis balísticos, foguetes e drones e deixou 20 mortos e ao menos 30 feridos, segundo Kiev; na sexta, Trump disse que Putin está fazendo ‘o que qualquer um faria neste momento’

Pelo menos 20 pessoas morreram, e 30 ficaram feridas na madrugada deste sábado, 8, em bombardeios russos na região ucraniana de Donetsk (leste), no momento em que o presidente dos Estados Unidos, Donald Trump, voltou a ameaçar a Rússia com sanções e tarifas caso continuasse atacando a Ucrânia.
“Durante a noite, os russos bombardearam o centro de Dobropilia. Pelo menos 12 pessoas morreram e outras 30 ficaram feridas”, informaram os serviços de emergência no Telegram.
As autoridades de Donetsk inicialmente haviam relatado quatro mortes no ataque russo. Na região de Kharkiv, também no leste da Ucrânia, um drone atacou um estabelecimento privado na cidade de Bohodukhiv, informou Oleg Siniehubov, chefe da administração militar regional.
“Infelizmente, uma pessoa morreu, e seu corpo carbonizado foi recuperado dos escombros. Outras sete pessoas ficaram feridas”, publicou Siniehubov no Telegram. A Força Aérea ucraniana anunciou a derrubada de pelo menos 134 alvos, incluindo 34 mísseis e 100 drones.
Durante a noite, alertas aéreos soaram por todo o país. Em Ternopil (oeste), segundo o governador regional, Viacheslav Negoda, “mísseis atingiram uma instalação industrial”, sem causar vítimas.
Também houve danos na região de Odessa (sul), incluindo incêndios em três prédios residenciais.
O vai e vem de Trump
Os acontecimentos ocorreram após Trump advertir sobre sanções contra a Rússia. “Considerando que a Rússia está atacando intensamente a Ucrânia no campo de batalha neste exato momento, estou seriamente considerando impor sanções financeiras de grande escala e tarifas à Rússia até que seja alcançado um cessar-fogo e um acordo final de paz”, escreveu Donald Trump em sua rede Truth Social.
Pouco depois, no entanto, em uma conversa com repórteres no Salão Oval da Casa Branca, em Washington, Trump afirmou que considera “francamente mais difícil lidar com a Ucrânia” e que “pode ser mais fácil lidar com a Rússia”, porque “Putin quer terminar a guerra”.
Trump disse também que Vladimir Putin estava “fazendo o que qualquer um faria” depois que a Rússia lançou um massivo ataque com mísseis e drones na Ucrânia dias após os EUA cortarem ajuda vital de inteligência e militar para Kiev.
Os Estados Unidos suspenderam na sexta-feira o acesso de Kiev a imagens de satélite comerciais adquiridas por Washington, informou a Agência Nacional de Inteligência Geoespacial.
As forças ucranianas utilizam essas imagens para rastrear a movimentação das tropas russas e avaliar danos após os ataques.
Pressão sobre a Rússia
Zelenski, cujo confronto verbal na semana passada com Trump em um encontro na Casa Branca levou os Estados Unidos a suspenderem a ajuda militar a Kiev, voltou a pedir o fim dos bombardeios.
“Os primeiros passos para estabelecer uma paz real devem forçar a única fonte desta guerra, ou seja, a Rússia, a encerrar tais ataques”, escreveu ele no X, pedindo a proibição do uso de “mísseis, drones de longo alcance e bombas aéreas”.
O presidente ucraniano também pediu “paz o mais rápido possível” e declarou que seu país está trabalhando “intensamente” com os Estados Unidos para esse objetivo.
Zelenski disse que a Ucrânia está “totalmente comprometida” com diálogo construtivo com representantes dos EUA na Arábia Saudita na próxima semana e espera concordar com as decisões e etapas necessárias.
“A Ucrânia busca a paz desde o primeiro segundo desta guerra. Propostas realistas estão sobre a mesa. O importante é agir de forma rápida e eficaz”, disse Zelenski neste sábado, 8, na rede social X.
“Da nossa parte, estamos totalmente comprometidos com o diálogo construtivo e esperamos discutir e concordar sobre as decisões e etapas necessárias”, acrescentou.
Zelenski disse que visitará a Arábia Saudita na próxima semana e, após seu encontro com o príncipe herdeiro Mohammed bin-Slaman, na segunda-feira, representantes diplomáticos e militares ucranianos permanecerão para uma reunião na terça-feira com a equipe dos EUA.
De acordo com observadores militares, a situação das forças ucranianas se deteriorou na parte ocupada da região russa de Kursk, que Kiev deseja utilizar como moeda de troca em futuras negociações.
Diante das incertezas sobre o futuro do apoio militar dos Estados Unidos à Europa, os 27 líderes da União Europeia anunciaram na quinta-feira um plano chamado ReArm Europe, que visa mobilizar € 800 bilhões (cerca de R$ 5 trilhões) para fortalecer as capacidades de defesa.
Sem bilhões de dólares em armas de fabricação americana, pode ser apenas uma questão de tempo até que as forças da Ucrânia vacilem contra a Rússia.
Quanto tempo, no entanto, depende da rapidez com que a Europa e a Ucrânia podem compensar a artilharia, os mísseis, os sistemas de defesa aérea e outras armas que tiveram o envio suspenso segundo as autoridades do governo Trump.
Os Estados Unidos haviam se comprometido a entregar até US$ 11 bilhões em armas e equipamentos para a Ucrânia este ano. Parte desse valor era proveniente dos estoques do Pentágono, enquanto outra parte foi encomendada por meio de novos contratos de Defesa, de acordo com uma nova análise do Centro de Estudos Estratégicos e Internacionais em Washington. Um ex-funcionário sênior da Defesa dos EUA disse na terça-feira que o valor real provavelmente estava mais próximo de US$ 9 bilhões.
Apesar das promessas da Europa de apoio inabalável à Ucrânia, que só se intensificaram desde que o governo Trump começou a se retirar, seria quase impossível para o continente preencher a lacuna de armas rapidamente. As indústrias de Defesa europeias aumentaram, mas apenas aos trancos e barrancos. E os países individualmente precisam manter seus próprios estoques de armas.
“A Europa não tem condições de substituir a ajuda americana”, disse no mês passado o ex-vice-general do Estado-Maior das Forças Armadas da Ucrânia, tenente-general Ihor Romanenko.
A própria Ucrânia vem produzindo drones e construindo sistemas de artilharia de fabricação nacional, e planeja gastar 26% de seu orçamento em Defesa este ano. Mas algumas das principais autoridades ucranianas dizem que as Forças Armadas ficarão em situação difícil se o apoio americano não for retomado.
“A Ucrânia definitivamente tem uma margem de segurança de cerca de seis meses, mesmo sem a assistência sistemática dos Estados Unidos, mas será muito mais difícil, é claro”, disse um legislador, Fedir Venislavski, à agência de notícias RBC-Ucrânia na terça-feira.
Alguns analistas dizem que até mesmo isso pode ser excessivamente otimista. “Certamente, no período de quatro meses, suas forças começariam a se curvar, porque simplesmente não teriam munição e equipamentos suficientes para substituir o que perderam”, disse um dos autores do estudo do Centro de Estudos Estratégicos e Internacionais, Mark F. Cancian, ex-estrategista de armas da Casa Branca. / AP, NYT e AFP
Estadão