O Brasil também está em guerra, mas interna, contra o crime organizado; e está perdendo

O “sumiço” de metralhadoras de longo alcance do Arsenal do Exército em Barueri, São Paulo, é daqueles escândalos escabrosos que mexem em velhas e atuais feridas; o aquartelamento de militares indica que a suspeita é de que uma quadrilha agia ali.

Polícia do Rio de Janeiro encontrou 8 das 21 metralhadoras do Exército furtadas em SP. Foto: Polícia Civil RJ/Reprodução

Estadão

Elianhe Cantanhêde 

Comentarista da Rádio Eldorado, Rádio Jornal (PE) e do telejornal GloboNews em Pauta

Se a guerra de Israel amontoa corpos de crianças e os bombardeios continuam na Ucrânia (apesar do crescente desinteresse internacional), o crime organizado vai vencendo a guerra urbana brasileira, infiltrado nas instituições, nas polícias e agora até em quartéis do Exército Brasileiro. A sociedade está espremida entre o medo de criminosos e a descrença no estado, cruel com uns, conivente com outros. “Quem pode pode…”

Como em Israel, Gaza e Ucrânia, os cidadãos comuns brasileiros são vítimas inocentes e a lista de crianças cresce, não só por ação de traficantes, milicianos e ladrões, mas também por tiros da própria polícia e da guerra entre organizações criminosas, como os quatro médicos à beira da praia, tomando uma cervejinha.

O “sumiço” de metralhadoras de longo alcance do Arsenal do Exército em Barueri, São Paulo, é daqueles escândalos escabrosos que mexem em velhas e atuais feridas. Como 21 armas, com 1,75m e 40kg, são tiradas de uma área sensível, de segurança, sem ninguém ver, saber e impedir? O aquartelamento de 480 militares, reduzidos depois a 160, indica que a suspeita é de que uma quadrilha agia ali.

Essas armas, capazes de atingir helicópteros e aviões, eram “negociadas” com o que há de pior na tão sortida bandidagem nacional e oito delas foram parar, vejam bem, numa favela do Rio. Mais um roteiro para filmes de quinta de Hollywood. O comandante do arsenal, tenente-coronel, foi exonerado, mas falta saber quem faz parte da quadrilha e onde estão as demais metralhadoras. Como o Exército não fez BO, fica a pergunta: quem investiga, apreende as armas e prende os receptadores fora do quartel, em comunidades, estradas e esconderijos civis?

O Exército é o maior interessado em apurar o crime e punir com rigor os criminosos da Força. A revelação sacudiu a semana em que a CPMI do golpe pediu o indiciamento não só do ex-presidente Jair Bolsonaro, por quatro crimes, mas de dois ex-comandantes militares, um do Exército e outro da Marinha, dos generais do coração do antigo governo e um tenente-coronel da ativa, o famoso Mauro Cid, o que remete a outras encrencas: venda ilegal de joias nos EUA, atestados falsos de vacina, vazamento de investigações sigilosas da PF.

E tem o relatório da CPI da Pandemia, mostrando o vexame de um general da ativa no Ministério da Saúde, inclusive com coronéis envolvidos em negociações nebulosas de compra até de vacinas não autorizadas — um deles, aliás, alvo das duas comissões parlamentares, a da Pandemia e a do Golpe. Sem falar nos desvios durante a GLO no Rio e naquele suboficial da Aeronáutica que traficava cocaína para a Europa em avião da FAB. Logo, a principal missão do Exército é recuperar a imagem dura e longamente construída após a ditadura militar. Tem de ser duro nas investigações e punições.

E que tal os policiais civis do Rio (sempre o Rio…) embolados com os piores traficantes? Pagos pelo contribuinte para prender bandidos, escoltavam 16 toneladas (toneladas!) de maconha, à luz do dia, até na porta de delegacias. Em vez de admitir seu fracasso e agradecer à PF, o secretário de Segurança do estado ainda reclamou: “A Polícia Civil não precisa de babá”. Imagine se precisasse…

A semana fechou com mais duas operações da PF: uma contra policiais envolvidos com o tráfico no Rio e outra de busca, apreensão e prisões contra agentes da Agência Brasileira de Inteligência (Abin) que monitoravam celulares e movimentos de políticos, advogados, jornalistas e, talvez, até ministros do Supremo no governo Bolsonaro. Com que finalidade? Defensores da lei agindo fora da lei e confundindo a sociedade: afinal, quem é mocinho e quem é bandido?

Para concluir, uma pergunta: como você define o delegado que alegou que não houve “situação flagrancial” (flagrante) para liberar, sem um único dia de prisão, um criminoso abominável, que estuprava a própria sobrinha? A vítima, uma menininha de apenas seis anos, é esperta, corajosa, e gravou o bandido. Sim, sr. delegado, não havia flagrante, mas havia o vídeo do crime. Precisava prova mais contundente? Ponha-se no lugar do pai dessa criança…

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