De acordo com investigadores, entidades descontaram R$ 6,3 bi de aposentados e pensionistas entre 2019 e 2024

Uma operação deflagrada pela Polícia Federal e pela CGU (Controladoria-Geral da União), nesta quarta-feira (23), investiga descontos não autorizados em benefícios do INSS (Instituto Nacional do Seguro Social). O presidente da instituição, Alessandro Stefanutto, pediu demissão do cargo após ordem do presidente Lula.
A ação teve como objetivo combater um esquema nacional de descontos associativos não autorizados em aposentadorias e pensões. De acordo com as investigações, a soma dos valores descontados chega a R$ 6,3 bilhões, entre 2019 e 2024, mas ainda será apurado qual a porcentagem foi feita de forma ilegal.
Segundo o diretor-geral da PF, Andrei Rodrigues, com um único alvo, foram apreendidos vários carros, como uma Ferrari e um Rolls Royce, avaliados em mais de R$ 15 milhões. Com outro, 200 mil dólares e, um segundo, 150 mil. Também foram apreendidas joias e quadros.
“Isso por si só aponta para a gravidade daquilo que estamos falando e o tiro certo que demos nessa investigação”, disse. A PF não confirmou sobre quem estava em posse desses bens.
As investigações focaram entidades de classe, como associações e sindicatos, que formalizaram Acordos de Cooperação Técnica (ACT) com o INSS.
Esses acordos permitem que elas realizem descontos de mensalidades associativas diretamente na folha de pagamento dos beneficiários do INSS, desde que autorizados pelos aposentados e pensionistas.
Uma auditoria feita pela CGU em 29 destas entidades identificou que muitas não tinham estrutura operacional para prestar os serviços que ofereciam aos beneficiários, como descontos em academias, convênios com planos de saúde e auxílio funerário.
Também verificou que 72% não tinham entregue a documentação completa ao INSS. Onze foram alvo de medidas judiciais. Segundo o ministro da CGU, Vinicius de Carvalho, ainda é precipitado dizer que todo o valor repassado é ilegal, mas os casos estão sendo apurados.
“O que se pode dizer é que, de uma amostra de 1.300 casos analisados, 97% dos aposentados disseram não ter dado consentimento para o desconto ou ocorreram fraudes, como a falsificação de assinaturas”, afirmou. Todos os pagamentos foram suspensos.
Por determinação da Justiça, o presidente do INSS, Alessandro Stefanutto, foi afastado do cargo, assim como o procurador-geral do INSS, Virgílio Antônio Ribeiro de Oliveira Filho, o diretor de benefícios e relacionamento com o cidadão, Vanderlei Barbosa, o coordenador geral de suporte ao atendimento ao cliente, Giovani Batista, e o de pagamentos e benefício, Jacimar Fonseca da Silva. O pedido foi feito pela PF.
Depois, Stefanutto pediu demissão da presidência do instituto.
O ministro da Justiça, Ricardo Lewandowski, disse que a investigação “se trata de uma fraude contra os aposentados, pessoas que estão numa fase já adiantada da vida e, por isso, estão naturalmente debilitadas e foram vítimas fáceis desses criminosos que se apropriaram das pensões e aposentadorias”, disse o ministro.
Sobre a devolução dos recursos obtidos de forma ilegal, ele afirmou que cada caso terá que ser examinado individualmente
“Evidentemente que, mediante requisição e apuração interna, esse dinheiro um dia terá que ser restituído para aqueles aos quais foi retirado indevidamente”, disse.
O ministro Carlos Lupi (Previdência Social) disse que tomará as decisões cabíveis depois das investigações, mas afirmou que há cerca de um ano já há a opção na plataforma “Meu INSS” para sair do desconto.
Já o ministro da CGU afirmou que também serão investigadas supostas atuações ilegais de servidores do INSS ou de entidades no processo de assinaturas dos acordos de cooperação técnica.
Ele explicou que essas autorizações passam pela verificação de requisitos necessários para as entidades operarem esses benefícios e se pessoas filiadas autorizaram o desconto.
“Qualquer coisa que haja sobre participação de pessoas de maneira inadequada ou ilegal nesse processo será investigada, como a facilitação de servidores do INSS de pessoas destas entidades ou operadores”
Cerca de 700 policiais federais e 80 servidores da CGU cumpriram 211 mandados judiciais de busca e apreensão, ordens de sequestro de bens no valor de mais de R$ 1 bilhão, na maior operação já realizada pela Controladoria, segundo o ministro da CGU. As buscas incluíram o gabinete do presidente do INSS e sua residência.
Foram expedidos seis mandados de prisão temporária no Distrito Federal e nos estados de Alagoas, Amazonas, Ceará, Goiás, Maranhão, Mato Grosso do Sul, Minas Gerais, Paraná, Pernambuco, Rio Grande do Norte, Rio Grande do Sul, São Paulo e Sergipe. Até 12h, três pessoas haviam sido presas, outras três pessoas estariam foragidas.
Um agente da Polícia Federal de São Paulo também afastado do cargo por supostamente dar assistência ao esquema.
Os investigados poderão responder pelos crimes de corrupção ativa, passiva, violação de sigilo funcional, falsificação de documento, organização criminosa e lavagem de capitais.
Após a deflagração da ação, por volta das 6h30 da manhã, o ministro da CGU e o diretor-geral da PF se reuniram com o presidente para comunicar a necessidade do afastamento do presidente do INSS por omissão.
No governo Lula (PT), a operação é considerada delicada por afetar a credibilidade de um instituto que envolve milhões de beneficiários e os contribuintes do RGPS (Regime Geral de Previdência Social).
Questionado pela imprensa, o diretor-geral da PF disse que não poderia entrar em detalhes sobre o motivo do pedido de afastamento da cúpula do INSS, mas afirmou que a medida foi solicitada pela polícia, a partir dos elementos colhidos durante as investigações de um inquérito que foi instaurado em junho de 2024.
“Durante este período, a equipe de investigação, respeitando os princípios da autonomia, a prova e a responsabilidade institucional entendeu pela necessidade de peticionar à Justiça pelo afastamento”, afirmou.
Ele também declarou que houve notícias na imprensa, já no final de 2023, análise do TCU sobre esse episódio, ações da CGU reportando as sucessivas fraudes, “e o que percebeu foi a continuidade sem que houvesse ações mais efetivas no sentido contrário”.
O QUE FAZER?
Os aposentados e pensionistas do INSS que tiverem desconto indevido de mensalidade associativa no extrato de pagamentos (contracheque) podem pedir a exclusão do débito de forma automática pelo aplicativo ou site meu INSS.
Na tela inicial do Meu INSS é disponibilizada a consulta de “mensalidade associativa”. Em seguida, uma funcionalidade no aplicativo/site permite que aposentados e pensionistas além de consultarem o desconto no pagamento, peçam a exclusão e/ou bloqueio através do serviço “exclusão de mensalidade de associação ou sindicato” e/ou “bloqueio de mensalidade de associativa”. O serviço também pode ser solicitado pela Central 135, assim como diretamente às entidades associativas.
Folhapress