Integração internacional tem crescido. Mas vulnerabilidades, como a dependência de commodities e retrocessos ambientais, tributários, de infraestrutura e de governança, permanecem
Estadão
Seguindo seus procedimentos regulares, a Organização Mundial do Comércio (OMC) promoveu uma revisão das políticas comerciais do Brasil. A avaliação, que cobre um período de cinco anos (2017 a 2021), é instrutiva, por combinar dados sobre o comércio nacional, a avaliação de técnicos da OMC, as considerações de parceiros e as respostas do Brasil.
O parecer da OMC aponta que o País avançou em sua integração na economia mundial: entre 2017 e 2021, a parcela de exportações e importações no PIB nacional subiu de 24,3% do PIB para 39,2%. Apesar desse avanço quantitativo, o País manteve vulnerabilidades qualitativas. A exportação de mercadorias se tornou ainda mais concentrada em commodities, enquanto a importação segue concentrada em produtos industriais.
Entre as tendências de longo prazo, está a crescente dependência da China e a contração nas transações com parceiros tradicionais. Entre 2017 e 2021, o volume de exportações para a China subiu de 22,1% para 31,3%, enquanto para a União Europeia (UE) caiu de 14,1% para 13% e para a Argentina, de 8,2% para 4,2%. No mesmo período, as importações de produtos chineses subiram de 17,5% para 22,8%. As importações dos EUA permaneceram estáveis, enquanto as da UE caíram de 19,9% para 17,1%.
O agro se destaca como exemplo de boas práticas. Nas últimas décadas, o setor registrou aceleração da produtividade na comparação com outras áreas. Além disso, “os baixos níveis de subsídios domésticos, subsídios mínimos aos preços de mercado e baixo protecionismo ilustram o país como um exportador agrícola global competitivo”. O crédito rural com taxas administradas de juros permanece a principal política de incentivo ao setor. Mas, como destaca a OMC, trata-se de uma política produtiva e sustentável, na medida em que condiciona os empréstimos a resultados e práticas sustentáveis.
A produção industrial, por sua vez, permanece comparativamente grande e diversificada, respondendo por 11,3% do valor agregado bruto em 2021, mas está em declínio. “O custo Brasil, as iniciativas de pesquisas, desenvolvimento e inovação incipientes, a integração relativamente débil à economia mundial e os escudos pontuais contra a competição internacional continuam a minar a habilidade do Brasil para explorar plenamente seu potencial industrial.”
No exame de suas políticas comerciais, o País recebeu mais de 800 questões de parceiros na OMC. Do ponto de vista estritamente econômico, a avaliação do atual governo foi relativamente favorável. A UE, por exemplo, destacou “medidas tomadas para facilitar o comércio e os investimentos, melhorar o clima empresarial, colocar em prática novas regras de compras públicas e abrir ainda mais a economia brasileira para o mundo”.
Mas dois temas pesam negativamente: a questão ambiental e o sistema tributário. Muitos parceiros manifestaram apreensão em relação ao desmatamento. Outros aguardam esclarecimentos sobre inovações tributárias, em especial em relação às distorções fiscais entre produtos importados e nacionais e à complexidade do sistema. O Brasil respondeu que está implementando uma reforma “gradual” e apresentou indicadores de sustentabilidade do agro. Alguns parceiros receberam as palavras do presidente eleito Lula da Silva na Conferência do Clima (COP-27) como uma lufada de esperança. Mas ainda há uma clara expectativa de ações concretas que mostrem que todos esses compromissos e palavras são para valer.
De um modo geral, a avaliação dos técnicos da OMC foi positiva. Mas, ante os riscos de desequilíbrio fiscal, altas taxas de desemprego, pressões inflacionárias e rápido envelhecimento populacional, eles insistiram, para a surpresa de ninguém, que a resiliência da economia brasileira e sua capacidade de atrair novos investimentos, e assim gerar riquezas, bem-estar social e reduzir a desigualdade, dependem de reformas estruturais que, além de um regime tributário mais justo e simples, garantam o equilíbrio das contas públicas, diminuam a burocracia, eliminem gargalos na infraestrutura e estimulem a produtividade.