Presidente fez anúncio em um vídeo, da mesma forma como ocorreu na última campanha
O GLOBO
O presidente dos Estados Unidos, Joe Biden, anunciou formalmente sua candidatura à reeleição nesta terça-feira, pedindo mais uma chance aos americanos para terminar o que começou. A disputa do ano que vem caminha para ser um repeteco do pleito de 2020, quando o democrata venceu o então presidente Donald Trump — e a recusa do republicano em reconhecer a derrota mergulhou os EUA na maior crise institucional de sua História recente, levando à invasão do Congresso por trumpistas radicais.
Biden, que caso seja reeleito terminará o segundo mandato aos 86 anos, fez o anúncio em um vídeo de três minutos compartilhado nas redes sociais às 6h (7h no Brasil). Na gravação, o presidente não fala sobre os feitos de seu mandato, sobre a invasão russa na Ucrânia ou faz promessas para um possível segundo ato na Casa Branca, mas retrata a disputa eleitoral como uma batalha contra a extrema direita.
— Quando me candidatei a presidente há quatro anos, disse que estávamos em uma batalha pela alma dos EUA. E ainda estamos — disse Biden no vídeo, que começa com imagens do ataque ao Capitólio por uma turba trumpista em 6 de janeiro de 2021. — O dilema com o qual nos deparamos agora é se nos anos adiante teremos mais ou menos liberdade, mais ou menos direitos. Sei qual eu quero que seja a resposta e acho que você também. Não é hora de ser complacente. É por isso que concorro à reeleição.
O anúncio de Biden ocorreu exatos quatro anos após o lançamento de sua pré-candidatura à nomeação democrata para a eleição de 2020, também por vídeo. Sem mencionar o nome de Trump, o democrata diz que os “extremistas MAGA” — sigla em inglês para “Tornem os EUA grandes novamente”, slogan da campanha que levou republicano ao Salão Oval em 2016 — ameaçam a liberdade do povo americano.
— Toda geração de americanos enfrentou um momento em que precisaram defender a democracia — disse Biden. — Defendam nossas liberdades pessoais. Defendam o direito ao voto e nossos direitos civis. Este é o nosso momento.
A agenda do presidente não prevê nenhum compromisso de campanha nesta terça, mas seu primeiro discurso pós-anúncio será às 12h30 (13h30, hora do Brasil) em um sindicato de Washington, onde deve falar sobre devolver a “dignidade” ao povo “esquecido”. Há quatro anos, fez seu primeiro pronunciamento como candidato em um sindicato de Pittsburgh, na Pensilvânia, após divulgar o vídeo lançando-se na corrida à Casa Branca.
À noite, o presidente e a primeira-dama, Jill Biden, visitarão o Memorial à Guerra da Coreia, em Washington, juntamente com seu par sul-coreano, Yoon Suk-yeol, e sua esposa, Kim Keon-hee. Ao New York Times, conselheiros do presidente disseram que ele não deve mudar muito sua rotina nos próximos meses, apostando que os republicanos se engalfinharão nas primárias para definir o candidato do partido, e o trabalho democrata à frente do país se sobressairá.
O foco da agenda democrata deverá ser na recuperação da economia e em atribuir aos opositores a culpa por questões como os retrocessos no direito constitucional ao aborto e a dificuldade de impor mais controles à posse de armas de fogo. Todos os temas foram centrais em suas viagens pelo país nos últimos meses.
Os principais doadores do presidente também já foram convidados para um evento em Washington na sexta, que dará o pontapé inicial na campanha de arrecadação. O site da candidatura de Biden e sua vice, Kamala Harris, já aceita também doações, afirmando que, “juntos, podemos terminar o trabalho pelo povo americano”.
“Joe está dentro. Contribua para dar o pontapé na nossa campanha”, diz a parte que pede doações, sugerindo valores entre US$ 10 e US$ 250, com uma seção para “outros”.
Possíveis obstáculos
Há problemas, contudo, que podem eclipsar a candidatura: entre eles, investigações sobre os negócios financeiros de seu filho, Hunter, e a idade avançada, que desperta desconfiança de parta do eleitorado. Quando os americanos forem às urnas ano que vem, Biden estará a semanas de completar 82 anos. Trump terá 78 anos.
Segundo uma pesquisa da NBC News publicada no fim de semana, 70% dos americanos, incluindo 51% dos democratas, acreditam que ele não deveria concorrer a um segundo mandato.
Mas a legenda enfrenta dificuldades de renovação, e não há um nome de peso para substituí-lo, frustrando os desejos de alas da esquerda democrata, que desejam um representante mais jovem, mais progressista e mais representativo da diversidade do partido — e dos EUA. Apesar disso, não há grandes desafios internos à candidatura de Biden, com os dois desafiantes até agora, Marianne Williamson e Robert Kennedy Jr., sem grande fôlego.
A campanha pela reeleição será chefiada por Julie Chávez Rodríguez, sua conselheira e a latina a ocupar o cargo mais alto no atual governo americano, dirigindo o Escritório da Casa Branca para Assuntos Intergovernamentais. Será provavelmente a disputa política derradeira da vida de um homem que já concorreu sete vezes ao Senado e quatro vezes à Presidência e à Vice-Presidência.
O resultado do pleito deve ser fundamental para determinar qual será o legado de Biden, que já havia sido vice-presidente de Barack Obama entre 2009 e 2016. Uma segunda vitória sobre Trump — o favorito para abocanhar a indicação do Partido Republicano — sedimentaria o democrata como um presidente bem-sucedido que venceu as afrontas trumpistas contra a democracia. Uma derrota, por sua vez, iria na direção contrária.
O anúncio da candidatura também coincide com o início do julgamento civil de Trump por difamação e um suposto estupro cometido na década de 1990, após o estado de Nova York aprovar uma lei que permite a vítimas de abuso sexual denunciarem seus agressores independentemente de o crime já ter prescrito.
No início do mês, Trump se tornou o primeiro ex-presidente americano a ser denunciado criminalmente, acusado de falsificar registros comerciais antes das eleições presidenciais de 2016, incluindo o suposto suborno de US$ 130 mil da atriz pornô Stormy Daniels para abafar um caso extraconjugal que mantiveram dez anos antes. Continua, ainda assim, a ser o favorito para a indicação republicana, seguido pelo governador da Flórida, Ron DeSantis.
Veja quem é quem na disputa eleitoral americana
Marianne Williamson (Partido Democrata)
A escritora, de 70 anos, anunciou formalmente sua segunda candidatura à Casa Branca — após uma campanha malsucedida em 2020 — em março deste ano. Na eleição passada, a guru de autoajuda e líder espiritual não conseguiu ganhar espaço em meio a tantos outros candidatos democratas, mas suas aparições nos debates chamaram a atenção.
Durante a pré-candidatura em 2020, Williamson pressionou pela expansão dos programas de assistência social e por reparações aos descendentes de escravizados. Depois de suspender a campanha, apoiou o empresário e pré-candidato Andrew Yang, antes de endossar oficialmente a candidatura de Bernie Sanders.
Robert Kennedy Jr. (Partido Democrata)
Filho do senador Robert F. Kennedy, assassinado em 1968, e sobrinho do ex-presidente John F. Kennedy, o político teve a pré-candidatura confirmada pelo tesoureiro da sua campanha na semana passada. Aos 69 anos, Kennedy Jr. é conhecido pelo ativismo antivacina e pelo compartilhamento frequente de informações falsas nas redes sociais. Ele teve sua conta removida pelo Instagram em 2021.
Apesar disso, o democrata é elogiado pelo seu posicionamento em questões como preservação da água potável, e trabalhou ativamente para limpar o rio Hudson.
Donald Trump (Partido Republicano)
O ex-presidente Donald Trump lançou oficialmente sua campanha em novembro do ano passado, poucos dias após as últimas eleições legislativas e apesar dos apelos de alas do Partido Republicano para que voltasse atrás após o mau desempenho dos candidatos apoiados por ele.
Na semana passada, Trump se tornou o primeiro ex-presidente americano a se tornar réu, por 34 imputações referentes a três casos relacionados à falsificação de registros comerciais antes das eleições presidenciais de 2016, incluindo o suposto suborno de US$ 130 mil da atriz pornô Stormy Daniels para abafar um caso extraconjugal — que ele sempre negou.
As penas, somadas, podem chegar a 136 anos de prisão. A denúncia, no entanto, não impede seus planos de voltar à Casa Branca em 2024 — pelo contrário, pode até impulsioná-los.
Ron DeSantis (Partido Republicano)
O governador da Flórida ainda não anunciou que será candidato, mas aparece à frente em várias pesquisas, inclusive de seu guru, o ex-presidente Donald Trump. No fim de fevereiro, ele lançou seu novo livro de memórias — “The Courage to be Free: Florida’s Blueprint for American Revival” (“A coragem de ser livre: o projeto da Flórida para o renascimento americano”, em tradução livre) —, uma espécie de pontapé não oficial de sua pré-candidatura.
O livro detalha a resposta de DeSantis à pandemia, que, ao lado da questão migratória, o colocou nos holofotes nos últimos anos. O governador, de 44 anos, é visto como a maior ameaça, pelo menos inicialmente, de ganhar a indicação republicana no lugar de Trump. Em seus anos no Congresso, entre 2013 e 2018, DeSantis chegou a ser chamado de “jovem líder brilhante” pelo ex-presidente. Hoje, Trump o chama de “DeSanctimonius” (“DeHipócrita”, em português).
Os dois devem se encontrar no mês que vem durante o fórum anual da National Rifle Association (NRA, associação que defende o livre acesso às armas).
Nikki Haley (Partido Republicano)
A ex-governadora da Carolina do Sul foi a primeira republicana a anunciar sua pré-candidatura, em fevereiro. Embaixadora dos EUA na ONU durante o governo Trump, Haley é considerada uma figura em ascensão no Partido Republicano e ficou conhecida no cenário nacional por seguir a agenda de política externa do ex-presidente.
Em seu anúncio, a pré-candidata prometeu enfrentar adversários estrangeiro e aproveitou para pedir uma “mudança geracional” na legenda. Ela tem 51 anos. Caso vença a disputa pela indicação, Haley se tornaria a primeira mulher e a primeira asiática-americana a ser candidata pelo Partido Republicano.
Vivek Ramaswamy (Partido Republicano)
Aos 37 anos, o ex-executivo de biotecnologia ganhou fama nos círculos da direita americana por se opor aos esforços corporativos de promover causas políticas, sociais e ambientais — os chamados “woke”. Ele critica particularmente o investimento ambiental, social e de governança, ou ESG (na sigla em inglês).
Sem qualquer experiência política, Ramaswamy é o fundador da Roivant Sciences, uma empresa de saúde apoiada pelo SoftBank, em 2014, e cofundador da Strive Asset Management, que conta com o apoio do bilionário fundador do PayPal, Peter Thiel. Filho de imigrantes da Índia, foi uma criança superdotada na escola e teve uma curta carreira no rap enquanto estudava em Harvard.