Presidente preferiu usar tempo em Roma para sair pelas portas do fundo da embaixada e caminhar a pé com assessores
Por Folhapress
Ana Estela de Sousa Pinto
ROMA
O presidente do Brasil, Jair Bolsonaro (sem partido), encerra neste domingo (31) sua participação no G20 —grupo das 19 maiores economias do mundo mais a União Europeia— sem nenhuma reunião bilateral com líderes globais em sua agenda nem integração social com eles.
Isolado durante o evento, ele preferiu usar o tempo em Roma para sair pelas portas do fundo da embaixada brasileira e caminhar pelas ruas da capital italiana, como já havia feito nos dias anteriores, seguido por cerca de duas dúzias de apoiadores que se articulam por canais de WhatsApp.
Bolsonaro deixou a representação diplomática, onde está hospedado, às 10h40, enquanto o príncipe Charles já era ouvido por primeiros-ministros e presidentes na Nuvola, centro de convenções a 15 km dali. A cadeira do Brasil era ocupada pelo ministro das Relações Exteriores, Carlos França.
Na manhã deste domingo, Bolsonaro não participou de uma visita organizada pelo premiê italiano, Mario Draghi, à Fontana di Trevi, aonde tinha ido a pé na sexta (29). Draghi reuniu na cinematográfica fonte do século 18 líderes como a primeira-ministra alemã, Angela Merkel, o presidente francês, Emmanuel Macron, e os premiês indiano, Narendra Modi, espanhol, Pedro Sánchez, e britânico, Boris Johnson.
Os líderes posaram para foto em frente ao monumento e cumpriram o rito da moedinha: segundo a lenda, para voltar a Roma deve-se jogar uma moeda de costas para a fonte e depois voltar-se rapidamente para vê-la enquanto submerge. Na sexta, quando visitou o local, Bolsonaro não fez o tradicional gesto.
Alguns líderes não resistiram à tentação de molhar a mão nas águas da fonte antes de se dirigir ao centro de convenções onde tentariam neste domingo aparar diferenças sobre como combater a crise climática.
Na noite de sábado, os carros da comitiva presidencial voltaram à embaixada brasileira por volta das 23h30, enquanto líderes ainda aproveitavam os digestivos —servidos após um creme de tangerina— e a conversa no jantar oferecido pelo presidente da Itália, Sergio Mattarella, no palácio Quirinale.
Na mesa da recepção, o presidente dos EUA, Joe Biden, sentou-se ao lado de Mattarella e aproveitou para trocar ideias com a presidente da Comissão Europeia, Ursula von der Leyen, também sua vizinha.
A primeira-dama americana, Jill Biden, entreteve-se com Macron, enquanto era servido salmão marinado, risoto com abóbora e trufas brancas, linguado com alcachofra assada e purê de cenoura.
A primeira-dama brasileira, Michele, não estava presente. Bolsonaro veio a Roma com seu filho Carlos, com quem dividiu os sanduíches servidos na loja de embutidos em que entrou na sexta. No local, aliás, o fato de o presidente ter recusado um café e preferido uma Coca-Cola provocou comentários irônicos.
O apresentador do telejornal da emissora Rai disse que Bolsonaro vai “entrar para a história como o único presidente brasileiro que veio a Roma e recusou um café, produto que representa um elo entre os países”.
Também no G20 Bolsonaro foi visto isolado. Chamou a atenção dos repórteres que cobriram o primeiro encontro com o premiê italiano, anfitrião do evento, que o brasileiro tenha sido o único a quem Draghi não estendeu a mão.
Quando entrou na antessala do evento, Bolsonaro não foi abordado por nenhum dos líderes que já estavam no local, como Merkel, o australiano Scott Morrison ou o canadense Justin Trudeau, ou Boris, Macron e Von der Leyen.
O brasileiro foi para a mesa de café e tentou puxar conversa com os garçons, falando de suas origens italianas. “Todo mundo italiano aí?”, perguntou, de acordo com o repórter que representou os jornalistas brasileiros neste evento.
O interlocutor respondeu apenas com um aceno de cabeça, enquanto Bolsonaro tentava falar de suas origens italianas. Sem obter resposta, começou então a fazer uma piada com a final entre Brasil e Itália, na Copa de 1970, mas ninguém riu.
O presidente ficou alguns minutos sozinho olhando para os outros líderes conversando em grupos, apontando o dedo para os que sabia quem eram e falando com seus próprios seguranças, até que seus assessores lhe conseguissem um diálogo com o autocrata turco Recep Tayyip Erdogan.
Em cerca de dois minutos, Bolsonaro deu ao colega informações falsas sobre a pandemia, a economia brasileira e sua popularidade e criticou a Petrobras e a imprensa. Não fez nenhuma pergunta a Erdogan sobre a Turquia.
Depois de ignorar o ministro das Finanças da Alemanha, Olaf Scholz, provável futuro premiê alemão, ele cumprimentou Boris, trocou algumas frases com Modi e foi provocado pelo presidente argentino, Alberto Fernández, sobre futebol. Mais uma vez isolado, resignou-se a sentar ao lado do ministro da Economia brasileiro, Paulo Guedes, em um sofá distante dos outros líderes.
Quando os organizadores avisaram que a cúpula começaria, Macron entrou abraçado a políticos africanos e Merkel entrou rodeada por vários congêneres. O presidente brasileiro foi o último a deixar a antessala e se dirigiu à cúpula apenas com seus ministros.
Durante sua estadia em Roma, Bolsonaro viu o Vaticano do lado de fora, em caminhada com ministros em que terminou chamado de “genocida” por manifestantes contrários. Ele foi defendido pelo pequeno grupo de apoiadores, que, segundo Sandra e Sonia, duas imigrantes brasileiras que o integram, se conhece de atividades voluntárias em igrejas evangélicas de Roma.
Nesse período, Biden e Modi foram recebidos em audiência pelo papa.
O presidente brasileiro também não será recepcionado por nenhuma das autoridades católicas em Pádua, onde pretende visitar a basílica de Santo Antônio.