Todos serão julgados em 27 de julho por um escândalo de milhões de euros envolvendo a compra e financiamento de um edifício em Londres pelo Vaticano.
Por Folhapress
SÃO PAULO, SP (FOLHAPRESS) – O Vaticano anunciou neste sábado (3) o encaminhamento de dez pessoas, incluindo um cardeal, ao tribunal penal sob acusações de crimes financeiros, incluindo peculato, lavagem de dinheiro, fraude, extorsão e abuso de poder.
O cardeal Angelo Becciu, 73, ex-funcionário sênior da administração do Vaticano, assim como dois altos funcionários da unidade de inteligência financeira do Vaticano serão julgados em 27 de julho por um escândalo de milhões de euros envolvendo a compra e financiamento de um edifício em Londres pelo Vaticano.
Becciu, que o papa demitiu de seu posto no ano passado por suspeitas de nepotismo, torna-se a mais alta autoridade do Vaticano a ser acusada de crimes financeiros.
O papa deu pessoalmente a aprovação necessária na semana passada para que Becciu fosse indiciado, de acordo com um documento de 487 páginas acessado pela agência de notícias Reuters.
As acusações contra Becciu incluem peculato e abuso de poder. Uma italiana que trabalhava para ele foi acusada de peculato e o ex-secretário do cardeal, padre Mauro Carlino, foi acusado de extorsão.
Becciu afirmou em um comunicado que é inocente. Já o advogado de Carlino disse que seu cliente era inocente, que estava “agindo sob ordens” e que economizou milhões de euros ao Vaticano. O advogado afirmou, também, que começar um julgamento tão rapidamente não deu à defesa tempo suficiente para se preparar.
Dois corretores italianos, Gianluigi Torzi e Raffaele Mincione, foram acusados de apropriação indébita, fraude e lavagem de dinheiro. Torzi, para quem magistrados italianos emitiram um mandado de prisão em abril, também foi acusado de extorsão.
A investigação sobre a compra do edifício se tornou pública em outubro de 2019, quando a polícia do Vaticano invadiu os escritórios da Secretaria de Estado, o coração administrativo da Igreja Católica, e o da Autoridade de Informações Financeiras (AIF) do Vaticano.
O então presidente da AIF, Rene Bruelhart, um suíço de 48 anos, e o ex-diretor italiano da AIF, Tommaso Di Ruzza, 46, foram acusados de abuso de poder por supostamente não proteger adequadamente os interesses do Vaticano e dar ao corretor italiano Gianluigi Torzi o que o indiciamento denominou “vantagem indevida”.
Di Ruzza também foi acusado de peculato relacionado ao suposto uso indevido de seu cartão de crédito oficial e de divulgação de informações confidenciais.
Bruelhart alegou inocência em uma mensagem de texto e Di Ruzza não respondeu a contatos.
Em 2014, a Secretaria de Estado investiu mais de EUR 200 milhões de euros, grande parte deles provenientes de contribuições dos fiéis, em um fundo administrado pelo corretor Raffaele Mincione, comprando cerca de 45% de um edifício de luxo comercial e residencial na 60 Sloane Avenue, no distrito de South Kensington, em Londres.
À medida em que o negócio se tornou oneroso para os cofres do Estado, a Secretaria desembolsou outras dezenas de milhões de euros em pagamentos de taxas a intermediários na tentativa de alterar os termos da negociação e torná-la mais rentável. Junto a outros investimentos questionados, o prejuízo ao Vaticano chegaria a várias centenas de milhões de euros, segundo a imprensa italiana.
Na época, Becciu estava no último ano de seu cargo como vice-secretário de Estado para assuntos gerais, uma poderosa instância administrativa que movimenta centenas de milhões de euros. Becciu recebeu cinco acusações de peculato, duas de abuso de poder e uma acusação de induzir uma testemunha a perjúrio. Cerca de 75 páginas do documento são dedicadas a ele.
As principais acusações contra Becciu envolvem também contratos com empresas ou organizações de caridade controladas por seus irmãos em sua ilha natal, a Sardenha.
Nascida na Sardenha, Cecilia Marogna, 40, que trabalhou para Becciu, também foi acusada de peculato. A acusação afirma que ela recebeu cerca de 575 mil euros da Secretaria de Estado entre 2018 e 2019.
Ela afirmou a um canal de TV italiano que o dinheiro, enviado à sua companhia na Eslovênia, era destinado ao resgate de missionários sequestrados na África, mas a acusação afirma que uma boa parcela teria sido usado para benefício pessoal, incluindo a compra de bens de luxo.
O processo do prédio de Londres “está diretamente ligado às diretrizes e reformas de Sua Santidade, o papa Francisco, em favor da transparência e da consolidação das finanças do Vaticano”, disse a Santa Sé neste sábado.