CBF e médicos pedem cautela no estudo da volta do público aos estádios.

A ideia é avaliar o impacto de uma presença reduzida de torcedores, com cerca de 25% da carga de ingressos.

Foto: Reprodução Santa Portal.

Por Estadão Conteúdo 

Depois da longa paralisação do calendário pela pandemia e do retorno das competições com os portões fechados, o futebol brasileiro vive a expectativa do próximo passo da retomada gradual das atividades. O retorno da torcida aos estádios já é tema debatido entre os clubes, porém ainda distante quando se trata da liberação das autoridades. Tanto médicos como a própria CBF consideram prematuro estabelecer prazos para a reabertura dos portões.

“Todas as atitudes da CBF em relação à pandemia têm como base a proteção da saúde, tanto dos profissionais do esporte, quanto da população em geral. A entidade agiu sempre em consonância com as autoridades de saúde, seja na suspensão das competições, seja na retomada obedecendo a um rígido protocolo. A volta do público aos estádios será tratada da mesma forma”, disse ao Estadão o presidente da CBF, Rogério Caboclo.

O Estadão apurou que a discussão sobre o retorno do público já está em pauta entre alguns clubes. A ideia é avaliar o impacto de uma presença reduzida de torcedores, com cerca de 25% da carga de ingressos, para garantir o distanciamento social. O modelo de abertura do estádio, com limite de pessoas, já foi aplicado em alguns países europeus. No Brasil, o assunto tem sido debatido de forma discreta, até porque qualquer avanço nessa área depende de aval médico.

O retorno do público aos estádios interessa aos clubes para diminuir os gigantescos prejuízos que vieram com a pandemia. Em alguns jogos da Série A, as equipes chegam a ter gastos de até R$ 100 mil com taxas de arbitragem, impostos, funcionários ou aluguéis dos estádios. O dinheiro movimentado pelas partidas representa em períodos normais uma fatia importante do orçamento

Segundo estudo feito pela Ernst & Young, no ano passado, os 20 times da elite nacional faturaram cerca de R$ 952 milhões com receitas nos dias dos jogos. O valor corresponde a cerca de 16% do total arrecadado pelas equipes na temporada. Fora a verba com ingressos, ter torcida no estádio garante faturar com lanchonetes, venda de produtos oficiais e a prestação de serviços, como estacionamento, por exemplo.

Mesmo com a relevância da torcida para os clubes fecharem as contas, a CBF explicou que ainda não trabalha com um prognóstico nesse cenário. A entidade organizou um protocolo médico para o Campeonato Brasileiro com a previsão de disputar todo o torneio com os portões fechados. O encerramento será somente em fevereiro do ano que vem.

“O ideal, para preservar o equilíbrio esportivo, é que isso (a volta da torcida) aconteça em todo o país de maneira uniforme. Essa questão será enfrentada assim que as condições de saúde e segurança estiverem contempladas, o que esperamos que aconteça o mais breve possível”, afirmou Caboclo.

Para médicos consultados pela reportagem, ainda não é momento sequer de discutir a abertura dos estádios aos torcedores. É necessário aguardar a queda de taxas relativas a mortes, notificações de novos casos de covid-19 e ocupação de leitos em hospitais.

“Eu não acho prioritário reabrir estádios porque a questão nossa é retomar o ensino presencial. Como a epidemia é universal, não podemos ampliar áreas de contágio sem necessidade, no caso estádios e salas de cinema”, disse ao Estadão o epidemiologista e professor da USP Paulo Lotufo. “Acho que essa será uma questão para 2021 ou quando acertarmos a volta das aulas presenciais”, completou.

Os especialistas em saúde pública defendem que quando for o momento apropriado para se analisar a volta da torcida aos estádios se tenha um cuidado especial para a criação de protocolos e regras de prevenção. Isso inclui colocar recipientes de álcool em gel em vários pontos do local, espalhar os torcedores por diferentes setores das arenas, criar um esquema especial para consumo e venda de alimentos, higienizar banheiros e evitar aglomerações, entre outras medidas.

“Por mais que se discutam protocolos de cuidados, é muito difícil garantir a mudança de comportamento do torcedor e evitar que existam abraços ou comemorações. Por mais que se aplique a medição de temperatura das pessoas na entrada, isso não evita a presença no estádio de casos assintomáticos”, explicou a médica Infectologista Consultora em Biossegurança da Sociedade Brasileira de Infectologia (SBI), Sylvia Lemos Hinrichsen.

Para a infectologista da SBI e professora da Universidade Federal do Pará (UFPA) Tânia Chaves, por mais que na Europa os estádios comecem a reabrir, o Brasil precisa ter paciência. “Ainda não podemos nos espelhar nos outros países. Estamos vivendo em outro ritmo. É necessário ter uma sustentabilidade maior do número de casos e de óbitos antes dessa discussão”, comentou.

O médico e consultor da SBI Jaime Rocha alerta que, pelas grandes dimensões do Brasil, é possível que um determinado Estado possa ter condições de reabrir os estádios, mesmo com restrições, antes de algum outro. “O futebol não pode pensar que está em outra realidade, outro contexto. Cada região no Brasil vive uma realidade epidemiológica distinta. É até prejudicial para um campeonato ter público em uma cidade, mas não poder ter em outra”, afirmou.

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