Presidente mente ao dizer que nunca tentou ‘derrubar página de ninguém’ e que não é responsável pelo orçamento secreto
Estadão
O presidente Jair Bolsonaro (PL) mentiu ao falar de medidas contra usuários de redes sociais e orçamento secreto durante sabatina nesta sexta-feira, 21, promovida por Estadão, Rádio Eldorado, SBT, CNN, Veja, Terra e Rádio Nova Brasil. A entrevista substituiu o debate que ocorreria entre o candidato à reeleição e o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) – este último desistiu de participar.
Confira abaixo a checagem do Estadão Verifica sobre as principais declarações de Bolsonaro.
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Auxílio emergencial
O que Jair Bolsonaro disse: que seu governo concedeu auxílio emergencial para 68 milhões de pessoas.
O Estadão Verifica investigou e concluiu que: é verdade que o auxílio emergencial, inicialmente de R$ 600 e depois reduzido à metade, foi pago pelo governo federal a 68,2 milhões de pessoas com o objetivo de amenizar os danos econômicos causados pela pandemia de covid-19. Nem todas essas pessoas, contudo, tinham direito ao benefício. Balanço da Fiscalização do Auxílio Emergencial, do Tribunal de Contas da União (TCU), atualizado em setembro de 2022, estima que cerca de 7,3 milhões de pessoas fora dos requisitos legais teriam sido beneficiadas indevidamente.
Além disso, 6,4 milhões de mães chefes de família ganharam indevidamente uma cota excedente do benefício. A soma dos erros gerou um custo estimado de R$ 54 bilhões em pagamentos indevidos.
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Orçamento secreto
O que Bolsonaro disse: que vetou o orçamento secreto, mas que o Congresso derrubou o veto.
O Estadão Verifica investigou e concluiu que: é enganoso. Como mostrou esta checagem, a primeira tentativa de aprovar o orçamento secreto, de fato, partiu do Congresso e foi vetada por Jair Bolsonaro. Em dezembro de 2019, no entanto, o chefe do Executivo recuou do próprio veto e encaminhou novo projeto de lei que criou a emenda RP9.
O esquema foi revelado pelo Estadão, que mostrou, em uma série de reportagens, que a equipe do ministro da Economia, Paulo Guedes, havia convencido o presidente de que o orçamento secreto engessaria a economia. O atual ministro da Casa Civil, general Luiz Eduardo Ramos, ressuscitou a proposta e, dessa maneira, Bolsonaro voltou atrás na decisão de barrar a medida.
Índice de homicídios
O que Jair Bolsonaro disse: que, em 2021, foi registrado a menor taxa de assassinatos dos últimos 30 anos: 20 por 100 mil habitantes.
O Estadão Verifica investigou e concluiu que: é impreciso. O Atlas da Violência 2021 – mais recente mapeamento de mortes violentas no Brasil – traz dados referentes a 2019, quando foram registrados 45.503 homicídios no País, uma taxa de 21,7 mortes por 100 mil habitantes.
A taxa é a menor desde 1995 – ou seja, em 24 e não em 30 anos –, segundo o Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea), que organiza o estudo, Em 1992, por exemplo, a taxa era de 19,21.
O documento destaca que uma queda acentuada de 22,1% no número de mortes violentas, observada entre 2018 e 2019, deve ser vista com cautela em função da deterioração na qualidade dos registros oficiais nos últimos anos.
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Censura a páginas nas redes sociais
O que Bolsonaro disse: que nunca tentou “derrubar página de ninguém”.
O Estadão Verifica investigou e concluiu que: não é bem assim. No último 15 de outubro, a campanha do presidente pediu ao TSE (Tribunal Superior Eleitoral) que fossem derrubados todos os perfis das redes sociais do deputado federal André Janones (Avante-MG) até o fim da eleição. Segundo a coligação de Bolsonaro, Janones teria cometido abuso dos meios de comunicação para divulgar informações supostamente enganosas, incitando o compartilhamento de publicações depreciativas ao presidente.
Redução de IPI
O que Bolsonaro disse: que editou decreto para diminuir 35% do Imposto sobre Produtos Industrializados de 4 mil produtos.
O Estadão Verifica investigou e concluiu que: é verdadeiro. A declaração se refere ao Decreto nº 11.182/2022 que, segundo a Casa Civil, garante a redução de 35% no Imposto sobre Produtos Industrializados (IPI) da maioria dos itens fabricados no Brasil. O Agência Brasil explicou que esse imposto federal incide sobre cerca de 4 mil itens nacionais e importados que passaram por algum processo de industrialização.
Preservação do meio ambiente
O que Bolsonaro disse: que temos 84% da Amazônia preservada.
O Estadão Verifica investigou e concluiu que: é falso. Uma análise do projeto Mapbiomas, parceria entre universidades, ONGs e instituições nacionais, apurou que imagens registradas pelos satélites Landsat desde 1985 mostram que o Brasil perdeu 18% da Amazônia entre 1985 e 2017. O Observatório do Clima afirma também que cerca de outros 20% da floresta estão degradados, tendo presença de garimpos, grileiros e madeireiros ilegais.
Além disso, dados do Instituto de Pesquisas Espaciais (Inpe) indicam que o desmatamento acumulado na Amazônia sob o governo Jair Bolsonaro, de janeiro de 2019 a julho de 2022, atingiu 31 mil km².
Economia na pandemia
O que Bolsonaro disse: Gastamos R$ 700 bilhões em 2020, na pandemia. Não tivemos dólar indo para cima e bolsa indo para baixo.
O Estadão Verifica investigou e concluiu que: é enganoso. Embora seja fato que o governo federal destinou R$ 700 bilhões para enfrentamento da covid-19 em 2020, não é verdade que o dólar não subiu. Em dezembro de 2020, o dólar registrou aumento acumulado de mais de 29%, o que deixou a moeda brasileira com o segundo pior desempenho global no ano em meio à pandemia.
Em março de 2020, o Ibovespa despencou e acumulou desvalorização de 45%. No entanto, em dezembro, o índice reverteu as perdas no acumulado do ano e subiu 82,71%.
Votação do Auxílio Brasil
O que Bolsonaro disse: que a bancada do PT foi contra a criação do Auxílio Brasil de R$ 400.
O Estadão Verifica investigou e concluiu que: é falso. O Auxílio Brasil foi criado por meio de uma Medida Provisória (MP), sem passar por votação de imediato. A MP 1061 foi publicada no Diário Oficial da União em 9 de agosto de 2021, tendo efeito imediato. Posteriormente, no dia 25 de novembro, a medida foi votada pela Câmara dos e aprovada por 344 votos a favor, com apoio do PT e de outros partidos da oposição. Ninguém votou contra. No Senado, a votação foi simbólica e não teve o registro nominal dos votos. No entanto, de acordo com as notas da sessão, que ocorreu no dia 2 de dezembro de 2021, senadores do PT se manifestaram de maneira favorável.
Pagamento do Auxílio Brasil
O que Bolsonaro disse: que o Auxílio Brasil beneficia 21 milhões de pessoas e custa aproximadamente R$ 12 bilhões por mês.
O Estadão Verifica investigou e concluiu que: é verdade. De acordo com o Ministério da Cidadania, em outubro, o Auxílio Brasil será pago a 21,13 milhões de famílias. O investimento para o repasse mínimo de R$ 600 será de R$ 12,8 bilhões.
Meio Ambiente
O que Bolsonaro disse: que seu governo foi muito melhor do que os anteriores (no desmatamento).
O Estadão Verifica investigou e concluiu que: não é bem assim. Segundo dados do Projeto Prodes, no governo de Bolsonaro, a taxa de desmatamento da Amazônia subiu 73% nos três primeiros anos da gestão (2019 a 2021). Em 2020 e 2021, o desmatamento da Mata Atlântica teve aumento de 66% em relação a 2019, e também foi registrado aumento no desmatamento do Cerrado. Esses dados foram reunidos pela BBC e divulgados em 17/10/2022.
Preservação da vegetação
O que Bolsonaro disse: que hoje 2/3 do nosso solo está preservado, da mesma forma que Pedro Álvares Cabral encontrou.
O Estadão Verifica checou e concluiu que: não é bem assim. A MapBiomas levantou que, entre 1985 e 2021, o Brasil passou de 76% de cobertura de vegetação nativa para 66%. Apesar da porcentagem, isso não significa que essas áreas sejam totalmente conservadas: segundo a pesquisa, pelo menos 8,2% de toda vegetação nativa existente é secundária, ou seja, são áreas que já foram desmatadas pelo menos uma vez nos últimos 37 anos ou já estavam desmatadas em 1985.
Valor do Bolsa Família
O que Bolsonaro disse: que o Bolsa Família, até o ano passado, pagava R$ 42.
O Estadão Verifica investigou e concluiu que: não é verdade. O menor valor pago pelo Bolsa Família foi no ano de 2005, durante a gestão do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT): R$ 45,60 – em valores corrigidos pelo IPCA o benefício é de R$ 157,26. O valor mais alto da história foi durante o governo de Dilma Rousseff (PT), com média de R$ 155,90 (R$ 339,90 em valores de hoje, com a correção pelo IPCA). A mesma afirmação foi checada pelo Estadão Verifica no debate entre Bolsonaro e Lula promovido pela TV Band no último dia 16.
Política de drogas
O que Bolsonaro disse: que Lula já falou que quer a legalização das drogas.
O Estadão Verifica investigou e concluiu que: é falso. O plano de governo de Lula não prevê legalização de drogas. No item 34 das diretrizes do seu programa de governo, é defendida uma nova política sobre drogas “focada na redução de riscos, na prevenção, tratamento e assistência ao usuário”. No combate ao tráfico, fala de estratégias de enfrentamento e desarticulação das organizações criminosas, baseadas em conhecimento e informação, com o fortalecimento da investigação e da inteligência”.
Ministérios e apoio político
O que Bolsonaro disse: que não entregou cargos em ministérios em troca de apoio político.
O Estadão Verifica investigou e concluiu que: é falso. Em 2021, Bolsonaro deu a chefia da Casa Civil para o então senador Ciro Nogueira (PP-PI) para contornar o desgaste político que vinha sofrendo. Ciro é uma das lideranças do Centrão e já foi aliado de Lula.
O presidente também já havia nomeado a deputada federal Flávia Arruda (PL-DF) para chefiar a Secretaria de Governo. Ela ficou responsável por administrar a relação de sua administração com o Congresso.
Intervenção do Centrão em bancos públicos
O que Bolsonaro disse: que não entregou o comando de bancos públicos em troca de apoio político.
O Estadão Verifica investigou e concluiu que: é enganoso. No ano passado, o Estadão mostrou como a pressão de Valdemar da Costa Neto, presidente do atual partido de Bolsonaro, foi fundamental para a demissão de Romildo Carneiro Rolim da presidência do Banco do Nordeste.
Programa de alfabetização premiado pelo Banco Mundial
O que Bolsonaro disse: que o governo federal criou o programa conhecido como Recuperação de Aprendizado, que foi premiado pelo Banco Mundial como um dos melhores do mundo.
O Estadão Verifica investigou e concluiu que: é falso. Em maio de 2022, o Conselho Diretor do Banco Mundial aprovou o projeto de Recuperação das Perdas de Aprendizagem Provocadas pela Pandemia de COVID-19 no Brasil, no valor de US$ 250 milhões. Após a aprovação, não há registro que a iniciativa também tenha sido premiada.
Alfabetização infantil
O que Bolsonaro disse: que, em gestões passadas, uma criança era alfabetizada em três anos; em seu governo, são seis meses.
O Estadão Verifica concluiu que: é enganoso. O presidente voltou a repetir o dado que dissera em debate na Band. Na ocasião, ele disse que um aplicativo de jogos seria o responsável pelo suposto sucesso na alfabetização de crianças. Mas pesquisas feitas em vários países mostraram que ele não tem nenhum efeito na aprendizagem se for usado pelo aluno sozinho.
Segundo especialistas ouvidos pelo Estadão, o tempo considerado ideal para a alfabetização plena é de até dois anos (1º e 2º anos do fundamental).
Criação de ministérios
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O que Bolsonaro disse: que durante seu governo criou apenas o Ministério das Comunicações.
O Estadão Verifica investigou e concluiu que: é falso. Foram recriados o Ministério das Comunicações, em junho de 2020, e o Ministério do Trabalho e Previdência, em julho de 2021.
Durante sua eleição, Bolsonaro disse que governaria com no máximo 15 ministérios e começou com 22 pastas. O número subiu para 23 porque o Banco Central perdeu o status de ministério ao mesmo tempo em que o Ministério do Trabalho foi recriado.
Construção do Orçamento
O que Bolsonaro disse: que Orçamento quem faz é o Legislativo, não é por decreto (do Executivo).
O Estadão Verifica investigou e concluiu que: é enganoso. De fato, o Orçamento não é criado por decreto, porém não é correto afirmar que o responsável por ele seja o Poder Legislativo. É responsabilidade do Executivo materializar o Projeto de Lei Orçamentária e encaminhá-lo ao Congresso Nacional com a estimativa da receita e a fixação da despesa para o exercício financeiro do ano seguinte. O projeto entra em discussão e pode ser aprovado pelo Legislativo com modificações, mas retorna para que a lei seja sancionada (ou vetada) pelo presidente da República antes de ser publicada na imprensa oficial.