Covid ainda é uma das principais causas de mortes no Brasil

Só a doença provocou mais de 700 mil óbitos em três anos, segundo dados do Ministério da Saúde

UTI de atendimento exclusivo a crianças com Covid do Hospital Cândido Fontoura, o maior do estado de São Paulo – Adriano Vizoni – 4.fev.22/Folhapress

Folha de São Paulo 

Apesar de a mortalidade por Covid ter caído em 2022, a doença se mantém entre as cinco principais causas de morte no Brasil, segundo levantamento feito pelo DeltaFolha utilizando dados do SIM (Sistema de Informação de Mortalidade) do Ministério da Saúde.

Em 2020, quando começou a pandemia, morreram 194.976 pessoas de Covid. Com isso, ela se tornou a principal causa de morte por todos os tipos (incluindo causas externas, como acidentes e mortes violentas). O quadro se repetiu em 2021, quando foram contabilizados 424.133 óbitos apenas por Covid.

Nos últimos dois anos, as mortes por Covid superaram os dois principais tipos de causas de morte no país na última década: doenças do aparelho circulatório (incluindo infarto do miocárdio e doença isquêmica) e neoplasias (tumores).

Porém, em fevereiro de 2022, a Covid deixou de ser a principal causa de morte no país, ocupando o segundo lugar, atrás de doenças cardiovasculares (um conjunto variado que inclui diversos tipos de doenças). Depois, oscilou, mas ainda se manteve entre as cinco principais causas. Os números para o ano passado ainda são preliminares.

O cenário mais favorável, segundo os especialistas, deve-se principalmente ao avanço da vacinação, entretanto ainda é importante olhar para o impacto da Covid na saúde.

“Certamente não estamos vendo aqueles números elevados de mortes [por Covid] como a gente tinha antes”, diz a demógrafa Márcia Castro, professora na Universidade Harvard e colunista da Folha. “Para ter esse patamar de volta, só com um outro patógeno ou alguma variante que escapasse totalmente de anticorpos.”

Castro ressalta ainda que, apesar da melhora, não é possível prever qual será o patamar anual de mortes pela doença. “Acompanhando as hospitalizações por SRAG [síndrome respiratória aguda grave] por Covid conseguimos estimar a mortalidade de acordo com a tendência nos últimos meses, mas ainda não temos esse número.”

A pesquisadora lembra ainda que as diferentes coberturas vacinais de reforço na população também entram nessa conta. “Em um cenário hipotético em que todas as pessoas recebam os reforços, mesmo assim a mortalidade não vai ser zero, sempre vai existir uma taxa de mortes, mas há muito atraso vacinal.”

A porcentagem no número total de mortes anuais no país por Covid também caiu nos últimos meses. Se em abril de 2021, o mês que mais registrou mortes por Covid, 41,85% das mortes no país foram pelo coronavírus, ela representou cerca de 1,89% das mortes em setembro de 2022, quando foram disponibilizados os últimos dados, porcentagem similar ao que se registra de mortes por homicídio (1,8%).

“Nós tivemos dois picos terríveis que foram em maio de 2020 e depois nos primeiros meses de 2021, mas depois disso a mortalidade foi reduzindo, de tal forma que hoje nós estamos voltando ao nosso patamar basal”, explica o epidemiologista Paulo Lotufo, professor da Faculdade de Medicina da USP.

Ela [Covid] não é uma causa de morte independente”, diz a demógrafa.

É importante observar que a Covid é uma causa única, enquanto doenças cardiovasculares representam um conjunto de doenças que inclui várias causas. Alguns tipos de causas de morte vão apresentar variação quanto ao sexo, idade, condição social ou região do país.

Para a assessora técnica sênior da Vital Strategies Fátima Marinho, ex-diretora do Departamento de Vigilância de Doenças e Agravos Não Transmissíveis e Promoção da Saúde do Ministério da Saúde, o cálculo do impacto que a Covid teve em outras doenças depende de dados estratificados e que são muitas vezes difíceis de obter em nível nacional.

Um exemplo que ela cita é o cálculo de excesso de mortalidade feito nos Estados Unidos por pesquisadores do CDC (Centro de Controle e Prevenção de Doenças). Em alguns locais, como Nova York, o excesso de mortalidade verificado foi causado 60% por Covid (mortes diretas pela infecção do coronavírus), enquanto o restante foram causas associadas. “A gente sabe que a Covid pode ser uma causa associada ao comparar grupos de pessoas com a condição prévia de saúde e que tiveram ou não Covid. Esses efeitos podem durar ainda um tempo até serem bem definidos.”

Marinho lembra que a doença que mais teve mortes associadas com a Covid foi diabetes.

Um estudo mostrou que 40% dos pacientes diabéticos internados por Covid morreram pela doença, e a taxa de pessoas com diabetes cresceu nos últimos dois anos.

“O custo da saúde será ainda muito maior, porque, se antes tínhamos um total de pessoas a cada ano que necessitava de hospitalização e atendimento médico, agora é muito maior”, diz Marinho. “E, infelizmente, não temos critérios bem definidos para avaliar as sequelas de Covid.”

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