Decotelli entrega carta de demissão; Planalto prepara anúncio da saída.

Do mestrado ao pós – doutorado currículo de ministro apresenta inconsistências.

Decotelli em entrevista à jornalistas.

Por: Valdo Cruz, G1Phbwebcidade Parnaíba PI 

O ministro da Educação, Carlos Alberto Decotelli, entregou na tarde desta terça-feira (30) a carta de demissão ao presidente Jair Bolsonaro.

Até a última atualização desta reportagem, não havia a confirmação de que Bolsonaro aceitou o pedido. A expectativa do governo é encontrar um novo nome para o posto ainda nesta terça.

Após a polêmica sobre títulos que diz possuir, desmentidos pelas instituições de ensino, a própria equipe do presidente aconselhou Decotelli a deixar o cargo.

Embora tenha publicado uma mensagem em rede social elogiando a capacidade do ministro, desde a noite desta segunda, o presidente já dava como insustentável a situação dele.

Bolsonaro fez a publicação depois de ter se reunido com Decotelli e ouvido explicações.

São três os pontos questionados no currículo de Decotelli:

  • denúncia de plágio na dissertação de mestrado da Fundação Getúlio Vargas (FGV);
  • declaração de um título de doutorado na Argentina, que não teria obtido;
  • e pós-doutorado na Alemanha, não realizado.

Na última quinta-feira, Bolsonaro anunciou e o “Diário Oficial da União” publicou a nomeação do ministro. Mas no fim de semana, após se tornarem públicas inconsistências em seu currículo, nem chegou a tomar posse.

Entenda as polêmicas sobre os títulos acadêmicos do novo ministro da Educação, Carlos Alberto Decotelli da Silva.

Anunciado pelo presidente Jair Bolsonaro na última quinta-feira (25) como o novo ministro da Educação, Carlos Alberto Decotelli da Silva acumula ao mesmo quatro polêmicas sobre a sua fonação acadêmica.

As titulações estavam declaradas no perfil pessoal de Decotelli na plataforma Lattes do Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq), vinculado ao Ministério da Ciência e Tecnologia (MCTIC).

Essa plataforma integra dados de currículos, grupos de pesquisa e de instituições em um único sistema. Ela é autodeclaratória – são os próprios pesquisadores que atualizam os dados – e é considerada um padrão nacional para registro da vida acadêmica.

Terceiro ministro da Educação na gestão Bolsonaro, Decotelli terá quatro principais desafios à frente: a aprovação do Fundeb no Congresso, a realização do Enem 2020, a implantação da BNCC e o apoio aos estados e municípios na gestão da educação na pandemia.

A posse do ministro, prevista para esta segunda, foi adiada.

Para entidades de educação, currículo “não deveria ser objeto de mentiras” e inconsistências de Decotelli são algo “gravíssimo”.

(ATUALIZAÇÃO: nesta terça-feira (30), surgiram dúvidas sobre o apoio da empresa Krone no pós-doutorado de Decotelli e sobre a declaração de vínculo como professor da FGV. O texto foi atualizado às 11h38 e às 14h54.)

Confira abaixo as polêmicas no currículo:

Título de doutorado na Argentina, que não foi obtido

No currículo de Decotelli na plataforma Lattes constava originalmente a informação de doutorado na Universidade Nacional de Rosário concluído em 2009, com a tese “Gestão de Riscos na Modelagem dos Preços da Soja”, sob orientação de Antonio de Araujo Freitas Jr.

No entanto, Decotelli não teve a tese aprovada e com isso não obteve título de doutor na instituição. A informação foi divulgada na sexta-feira (26) pelo reitor da Universidade Nacional de Rosario, Franco Bartolacci, em uma rede social.

No mesmo dia, o currículo de Decotelli foi alterado. O título da tese e o nome do orientador foram excluídos do sistema. O campo “Título” foi preenchido com “Créditos concluídos”. E, no campo “Orientador”, passou a ser listado: “Sem defesa de tese”.

O ministro afirmou que concluiu todo o curso, completou todos os créditos, mas não fez a defesa de tese. Decotelli afirma que esteve na Argentina de 2007 a 2009, e que não tinha mais interesse em permanecer no país vizinho porque sua vida estava no Brasil.

Denúncia de plágio na dissertação de mestrado da FGV

Dois dias após o anúncio da nomeação de Decotelli, a Fundação Getúlio Vargas (FGV) anunciou no sábado (27) que vai “apurar os fatos referentes à denúncia de plágio na dissertação do ministro Carlos Alberto Decotelli”. A suspeita é que o novo ministro da Educação tenha copiado trechos e apresentado como produção intelectual própria no trabalho apresentado em 2008 para a conclusão de um mestrado em Administração na instituição.

Em nota, a FGV afirma que o orientador da dissertação foi procurado e que, caso seja confirmado um “procedimento inadequado”, serão tomadas medidas administrativas e judiciais contra o novo ministro.

Procurado pela TV Globo, o ministro Carlos Alberto Decotelli disse que, se cometeu omissões, estas se deveram a falhas técnicas ou metodológicas, e que, por respeito ao direito intelectual dos autores e pesquisadores citados, vai revisar seu trabalho. Caso sejam identificadas omissões, vai procurar viabilizar com a FGV uma solução para corrigi-las, disse o ministro.

O Ministério da Educação disse em nota que “o ministro refuta as alegações de dolo, informa que o trabalho foi aprovado pela instituição de ensino e que procurou creditar todos os pesquisadores e autores que serviram de referência e cujo conhecimento contribuiu sobremaneira para enriquecer seu trabalho”.

Pós-doutorado na Alemanha, não realizado

Em seu currículo Lattes, Decotelli afirmava ter feito um pós-doutorado na Bergische Universität Wuppertal, na Alemanha.

Nesta segunda-feira (29), a universidade diz, em um comunicado, que Decotelli não obteve fez pós-doutorado na instituição. O pós-doutorado é como se chama uma pesquisa e vivência acadêmica realizada em instituições de ensino superior por pesquisadores que já atingiram o nível de doutorado.

Em nota, a universidade alemã afirma que: “O Prof. Dr. Carlos Decotelli se aproximou da Profa. Dra. Brigitt Wolf para uma estadia de pesquisa de três meses em janeiro de 2016. Até 2017, ela foi professora de teoria do design, com foco em metodologia, planejamento e estratégia na Universidade de Wuppertal e é agora emérita. Carlos Decotelli não adquiriu um título em nossa universidade. Ele não foi um pós-doc em nossa universidade. A Universidade de Wuppertal não pode se pronunciar sobre títulos adquiridos no Brasil”,

O G1 verificou também uma alteração no currículo do ministro, na plataforma Lattes do Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq), que excluiu a citação ao pós-doutorado.

Apoio de empresa, não obtido

Professora na Universidade de Wuppertal, na Alemanha, Brigitte Wolf, afirma que o ministro da Educação Carlos Alberto Decotelli não obteve apoio da empresa Krone para fazer a pesquisa de pós-doutorado, conforme ele afirma em seu currículo na plataforma Lattes.

A TV Globo e o G1 entraram em contato com a empresa e o Ministério da Educação (MEC), mas até as 11h desta terça-feira (30), não havia recebido resposta.

Em resposta à TV Globo, Brigitte Wolf afirma que Decotelli pediu apoio à Krone, mas a empresa não teve interesse em cooperar.

“Carlos Decotelli veio a Wuppertal com a intenção de cooperar com a empresa Krone. Ele estabeleceu contato com um representante no Brasil. O professor Maser e eu o acompanhamos para visitar a sede alemã da empresa. Mas a empresa Krone não mostrou interesse em cooperar com Carlos Decotelli no projeto que ele propôs. Depois que a empresa negligenciou o projeto, Carlos Decotelli mudou de assunto, voltou ao Brasil e continuou sua pesquisa no Brasil”, afirmou.

Vínculo como professor da FGV

A Fundação Getúlio Vargas (FGV) afirmou nesta terça-feira (30), em nota, que o ministro da Educação, Carlos Alberto Decotelli, não faz parte do quadro de professores efetivos da instituição.

No currículo na plataforma Lattes, Decotelli cita 18 vezes o vínculo institucional com a FGV, entre 2001 e 2018, como “professor” da fundação.

Segundo a FGV, ele deu aulas em cursos vinculados à fundação, como professor colaborador, mas não faz parte do quadro de professores efetivos das escolas da FGV.

“O Prof. Decotelli atuou apenas nos cursos de educação continuada, nos programas de formação de executivos e não como professor de qualquer das escolas da Fundação”, afirmou a instituição.

“Ele foi um professor colaborador, não tinha vínculo com a FGV. Deu aula em diversos cursos lato sensu. Foi também um dos coordenadores do MBA em Finanças na FGV e do curso ‘Gestão Financeira Corporativa””, afirma a FGV.

Para pesquisadores, a descrição do vínculo deveria ser mais específica, como “professor colaborador”, para não dar margem à interpretação como professor efetivo da instituição.

Íntegra da nota do MEC

O Ministério da Educação (MEC) esclareceu algumas das inconsistências em nota divulgada em 27 de junho, leia a íntegra:

“O Ministério da Educação, com relação aos questionamentos levantados a respeito da formação acadêmica do Ministro Carlos Alberto Decotelli da Silva, esclarece que o ministro cursou o Doutorado em Administração na Universidade de Rosário, na Argentina, no período de 2 de outubro de 2007 a 7 de fevereiro de 2009, tendo sido aprovado em todas as disciplinas com todos os créditos, conforme atesta o certificado emitido pela Universidade.

O ministro informou ainda que tem muito orgulho do curso realizado, principalmente por ter sido custeado com seus próprios recursos financeiros e pelo fato de ter sido aceito em tão respeitada instituição de ensino no exterior unicamente em função de sua qualificação acadêmica, construída ao longo da vida com muito esforço e dedicação.

Ao final do curso, apresentou uma tese de doutorado que, após avaliação preliminar pela banca designada, não teve sua defesa autorizada. Seria necessário, então, alterar a tese e submetê-la novamente à banca. Contudo, fruto de compromissos no Brasil e, principalmente, do esgotamento dos recursos financeiros pessoais, o ministro viu-se compelido a tomar a difícil decisão de regressar ao país sem o título de Doutor em Administração.

Tendo trabalhado como professor de gestão de riscos em derivativos no agronegócio em vários cursos no Brasil, construiu um projeto de pesquisa intitulado “Sustentabilidade e Produtividade na automação de máquinas agrícolas”, que foi submetido à Bergische Universitat Wuppertal, na Alemanha, tendo por base pesquisa específica que teve o apoio da empresa Krone (www.krone.de). A universidade alemã aceitou apoiar o projeto, considerando a relevância do tema, a conclusão e a aprovação em todos os créditos obtidos no curso de Doutorado em Administração na Universidade de Rosário e seus 30 anos de atuação como conceituado professor no Brasil. A pesquisa, que foi orientada pela Dra. Brigitte Edith Ursula Wolf e pelo Dr. Siegfried Maser, foi concluída e publicada em 10 de outubro de 2017. Ressalta-se que, por questões de sigilo em relação aos dados da citada empresa, o acesso ao texto integral da pesquisa está disponível apenas por meio de visita presencial ao cartório de registros acadêmicos na cidade de Koln, na Alemanha.

Em abril de 2017, recebeu documento que atesta o registro de seu trabalho. O ministro ressalta que não recebeu títulos em decorrência desta pesquisa.

De forma a dirimir quaisquer dúvidas, o ministro já efetuou os devidos ajustes em seu currículo, que, em breve, estarão refletidos nas principais plataformas de divulgação de dados profissionais.

Com relação às ilações sobre plágio na dissertação de mestrado intitulada “BANRISUL: do PROES ao IPO com governança corporativa”, apresentada em 2008 à Fundação Getúlio Vargas (FGV), o ministro refuta as alegações de dolo, informa que o trabalho foi aprovado pela instituição de ensino e que procurou creditar todos os pesquisadores e autores que serviram de referência e cujo conhecimento contribuiu sobremaneira para enriquecer seu trabalho. O ministro destaca que, caso tenha cometido quaisquer omissões, estas se deveram a falhas técnicas ou metodológicas. Informa também que, ainda assim, por respeito ao direito intelectual dos autores e pesquisadores citados, revisará seu trabalho e que, caso sejam identificadas omissões, procurará viabilizar junto à FGV uma solução para promover as devidas correções.

O ministro informou ainda que este trabalho teve respaldo no período de março de 2004 a dezembro de 2010, quando foi responsável pela capacitação de mais de 3.000 profissionais do BANRISUL, tendo agregado esta vivência profissional e seu conhecimento da cultura do Banco como base de referência para a construção da dissertação, agregando informações públicas disponíveis em sites públicos e privados pertinentes aos relatórios e informações de empresas S.A. de capital aberto.”

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