A estratégia do governo será convencer senadores a retirar assinaturas de apoio ao funcionamento da comissão, o que pode inviabilizá-la.
Por Estadão
BRASÍLIA – O governo do presidente Jair Bolsonaro age para conter os danos com a CPI da Covid no Senado, que teve sua instalação determinada pelo Supremo Tribunal Federal nesta quinta, 8. Uma das estratégias, segundo o Estadão ouviu de aliados do Palácio do Planalto, será convencer senadores a retirar assinaturas de apoio ao funcionamento da comissão, o que pode inviabilizá-la. Caso não obtenha sucesso, a ideia é ampliar o escopo e colocar governadores e prefeitos no alvo, além do próprio ministro Luís Roberto Barroso, que ordenou a instalação da comissão.
Na manhã desta sexta-feira, 9, Bolsonaro atacou o magistrado, acusando-o de promover “politicalha” e de “militância política” para desgastar seu governo. Ele também cobrou a abertura de processos de impeachment contra ministros da Corte.
Barroso determinou que o Senado instale uma CPI para investigar ações e omissões da gestão Bolsonaro no combate à pandemia. O presidente do Senado, Rodrigo Pacheco (DEM-MG), criticou a decisão, mas afirmou que vai obedecer a determinação e ler o requerimento de instalação da CPI na semana que vem.
A criação da CPI da Covid preocupa o Palácio do Planalto por aprofundar o desgaste do governo em um momento de queda de popularidade de Bolsonaro e de agravamento da pandemia. Uma vez criada, a comissão poderá convocar autoridades para prestar depoimentos, quebrar sigilos telefônico e bancário de alvos da investigação, indiciar culpados e encaminhar pedido de abertura de inquérito para o Ministério Público.
Alguns cenários são discutidos no momento. Pacheco ainda pode recorrer da liminar antes de ler o requerimento que cria oficialmente a CPI. Nesta quinta, ele afirmou que iria avaliar essa possibilidade com os advogados da Casa.
Outro fator que pode impedir o início dos trabalhos é a retirada de assinaturas do pedido de CPI. Atualmente, são 32 senadores apoiando. Para inviabilizar a comissão, o Planalto precisa convencer ao menos seis parlamentares a retirarem seus nomes. O mínimo necessário é 27.
Mesmo com a instalação da CPI, o governo também avalia que pode evitar que a oposição obtenha maioria no colegiado, a ser formado por 11 titulares e sete suplentes. As vagas são distribuídas conforme o tamanho das bancadas. Assim, o MDB, partido dos líderes do governo Fernando Bezerra (PE) e Eduardo Gomes (TO), deve ter o maior número de assentos.
Além disso, senadores defendem abertamente a inclusão de práticas adotadas por prefeitos e governadores no escopo da apuração, argumentando que verbas federais para o enfrentamento da covid-19 foram encaminhadas a Estados e municípios, motivo pelo qual esses entes devem ser igualmente investigados. A estratégia seria uma forma de dividir o foco.
“Talvez esse seja o principal objeto da CPI. Fatalmente, vai envolver Estados. Qualquer medida de apuração de transferência de recursos do governo federal vai cair nos governos estaduais e municipais”, afirmou o líder do PSDB no Senado, Izalci Lucas (DF), que é próximo ao governo. “Verba federal sendo utilizada de forma errada por prefeito não vai entrar? Se envolve verba federal, vai terminar envolvendo tudo”, afirmou o senador Otto Alencar (PSD-BA).
Ofensiva contra Barroso
No Senado, Barroso tem sido criticado por ter determinado individualmente a instalação da CPI. Vice-líder do governo, o senador Carlos Viana (PSD-MG) passou a coletar apoio para iniciar uma investigação contra o ministro do Supremo
A ideia é criar uma outra CPI para apurar a decisão de Barroso e até apresentar um pedido de impeachment contra o ministro. Os senadores são responsáveis por analisar os processos contra integrantes da Corte.
“Vou apresentar um pedido de CPI para investigar a interferência entre Poderes. Se houver crime de responsabilidade pode ser feito pedido de impeachment”, afirmou Viana ao Estadão/Broadcast. Ele negou que esse seja um pedido do Palácio do Planalto. “É uma decisão minha e de vários senadores. Não falei hora nenhuma com o Planalto sobre o assunto.”
A exemplo da comissão sobre a covid-19, a CPI contra Barroso depende de 27 assinaturas e de decisão de Pacheco para ser iniciada. “Depois da liminar, por que (Pacheco) se recusaria?”, questionou Viana.
Nesta quinta, o presidente do Senado classificou a decisão do ministro do STF como “equivocada” e avisou: “evocará precedentes absolutamente inadequados para o momento do País.”
Mesmo entre os senadores que assinaram o requerimento para a abertura da CPI, há alguns insatisfeitos com a decisão de Barroso. Os senadores Plínio Valério (PSDB-AM) e Oriovisto Guimarães (Podemos-PR) disseram que são contra a possibilidade de o ministro decidir sozinho sobre isso. “Não gosto de decisões monocráticas”, afirmou Oriovisto.
“Se fosse o presidente do Senado, não obedeceria a determinação do ministro Barroso por entender que ele não tem essa prerrogativa. O Supremo não tem essa função de interferir dentro do Senado, a questão é nossa”, disse o senador tucano do Amazonas. Apesar disso, os dois senadores afirmaram que vão manter as assinaturas no requerimento de instalação da CPI.
“Ele (Barroso) quis dar um tapa no Senado, no colegiado como um todo. Quando ele foi indicado para ter o voto dos senadores, ele não faria isso. Não foi uma decisão jurídica, foi uma decisão política”, afirmou Otto Alencar à reportagem. O senador também nega retirar sua assinatura da lista de apoio à CPI.
O presidente do Senado pretende ler a solicitação para criar a CPI na semana que vem e depois disso os partidos terão que indicar os integrantes. O Estadão procurou um integrante da cúpula Progressistas, aliado do Planalto, que disse que o partido não vai ser célere para indicar os integrantes do colegiado e que só vai fazer isso depois de todas as outras legendas indicarem.