Nome do ex-prefeito de São Paulo foi anunciado nesta sexta-feira, 9, pelo presidente eleito Luiz Inácio Lula da Silva
Estadão
BRASÍLIA – Indicação mais aguardada antes mesmo do resultado das urnas, o comando do novo Ministério da Fazenda do próximo governo, a partir de 1º de janeiro, será de Fernando Haddad, uma das principais lideranças do Partido dos Trabalhadores e candidato natural à sucessão de Lula nas eleições de 2026.
O nome de Haddad se impôs à posição de integrantes do partido que defendiam que o ex-prefeito de São Paulo (2013 a 2016) e ex-ministro da Educação (2005 a 2012) fosse escolhido para um ministério com agenda positiva para evitar desgaste político no Ministério da Fazenda, onde ficará mais exposto à pressões e terá muitas vezes de dizer “não” às demandas dos colegas de Esplanada, parlamentares, empresários e setores da sociedade civil.
A escolha seguiu o script desenhado na campanha eleitoral, de que o ministro da Fazenda de Lula 3 seria um político, como foi com Antônio Palocci no seu primeiro mandato, há 20 anos.
A indicação também revela o desejo de Lula de ter no comando da economia um nome com quem tenha proximidade, a despeito de fogo amigo dentro do PT enfrentado pelo futuro ministro desde sua campanha à prefeitura.
As reações ruins do mercado financeiro, que surgiram quando o nome de Haddad apareceu como favorito, também não dissuadiram Lula, que costuma dizer que seu principal foco na economia é combater a miséria.
Por outro lado, a estratégia consolida a percepção de que a política econômica não será de um superministro, como Paulo Guedes, o Posto Ipiranga de Bolsonaro, com ideias já prontas na cabeça, mas de governo sob a orientação muito próxima do presidente que acomode também os compromissos da frente ampla que o apoiou, e não só do PT. Tanto é que o novo Ministério do Desenvolvimento, Indústria e Comércio, que será separado da Fazenda, já nasce mais forte.
Apesar das cobranças nas últimas semanas pela indicação, Lula estrategicamente preservou Haddad das negociações da Proposta de Emenda à Constituição (PEC) da transição, que tem a marca do aumento de gastos e colocou os investidores do mercado financeiro em estado de alerta sobre os riscos para a sustentabilidade da dívida pública.
Haddad, avaliam interlocutores próximos a eles, teve inteligência política e emocional de não cair na armadilha de falar sobre as negociações sobre da PEC no primeiro “teste” como futuro ministro, quando representou Lula em encontro na Federação Brasileira de Bancos (Febraban).
As declarações de Haddad aos banqueiros não foram bem recebidas pelos operadores do mercado. Por outro lado, uma operação de aproximação dele com importantes interlocutores do mundo financeiro foi deflagrada para afastar as desconfianças em relação ao seu nome e sua preparo técnico para conduzir a politica econômica.
Entre os apoios recebidos, o do banqueiro André Esteves, do BTG, que esteve com Lula em Brasília e disse que poderia trabalhar por Haddad. Mas seguem a preocupações dos agentes financeiros de que ele, aspirante a suceder Lula, teria dificuldade, como político, em contrariar pedidos de aumento de gastos, subsídios e incentivos fiscais.
Depois da reunião da Febraban, com a perspectiva consolidada da sua indicação, algumas das resistências começam a ser afastadas, tendo pipocado falas como a do diretor da consultoria americana de risco político Eurasia, Christopher Garman, que em entrevista ao Estadão/Broadcast disse que o nome de Haddad “não vai ser tão ruim quanto o mercado teme”.
Controle de Despesas
Haddad foi aconselhado a formar uma equipe de economistas renomados no primeiro e segundo escalões do Ministério da Economia. Nos últimos dias em Brasília, também se posicionou na defesa da construção de um novo arcabouço fiscal para substituir o teto de gastos e avaliação de gastos, em linha com o discurso do vice-presidente Geraldo Alckmin.
Posição que já embute, segundo aliados, uma estratégia “para a frente”, depois da PEC, que está conectada com o compromisso firme com a aprovação da reforma tributária para acelerar o crescimento. Segundo assessores, ele está no grupo do PT que defende um regra de controle de gastos e da dívida pública.
Espelho
Na disputa pelo governo do Estado de São Paulo, Haddad deu ênfase à pauta econômica, em um espelho da aposta nacional do partido para eleger Lula.
Ele fez a promessa de reindustrializar o Estado de São Paulo, com foco em uma agenda sustentável, zerar impostos da carne e da cesta básica e congelar o IPVA por quatro anos, por exemplo.
Alianças
Haddad trabalhou para construir a aliança que colocasse o ex-tucano Geraldo Alckmin próximo a Lula. No início, segundo ele mesmo conta, queria que Alckmin abrisse espaço para Lula no palanque de sua candidatura ao governo do Estado de SP. Ele e Alckmin iriam concorrer um contra o outro. Acabou se tornando padrinho da inusitada união, selada em um jantar na sua casa, e o movimento ao mesmo tempo descartou o ex-tucano como um de seus seus concorrentes. Isso também colocou Haddad no papel de articulador das alianças de Lula durante a campanha deste ano.
Ele aproveitou os canais abertos com políticos centristas, que antes eram fruto de críticas no PT, no papel de “articulador do alto clero”, como define um de seus amigos. Além da aliança com Alckmin, ele esteve por trás, por exemplo, da federação com o PV, da reaproximação de Lula com Marina Silva, Marta Suplicy e Cristóvam Buarque, e do apoio do PROS à candidatura de Lula.
Essas costuras políticas, na avaliação de amigos, colocariam por terra as críticas de que teria dificuldades de negociar com o Congresso.
Paulista de família de imigrantes libaneses, 59 anos, Haddad é bacharel em direito pela Universidade de São Paulo, mestre em economia política e doutor em filosofia. É professor de ciência política da USP. Foi analista de investimento no Unibanco, consultor da Fundação de Pesquisas Econômicas (Fipe), chefe de Gabinete da Secretaria de Finanças e Desenvolvimento Econômico da Prefeitura do Município de São Paulo do governo Martha Suplicy.
Trabalhou no Ministério do Planejamento do Governo Lula durante a gestão de Guido Mantega (2003–2004), quando elaborou o projeto de lei que instituiu as Parcerias Público-privadas (PPPs) no Brasil. Foi ministro da Educação (2005-2012), prefeito de São Paulo (2013-2016) e candidato à presidente da República em 2018.
É casado com a odontóloga Ana Estela Haddad.