Saiba quem foi Justin Fashanu, o 1º jogador de futebol a se declarar gay

Atacante foi revelação inglesa no começo dos anos 1980 e cometeu suicídio

Justin Fashanu com a camisa do Brighton, da Inglaterra. Ele foi o primeiro jogador de futebol profissional a assumir-se homossexual, em 1990, e cometeu suicídio oito anos depois. /Reprodução

Por Folhapress

Alex Sabino

SÃO PAULO

Chegou o momento em que Brian Clough perdeu a paciência. Ele havia convencido a diretoria do Nottingham Forest a pagar 1 milhão de libras (R$ 7,5 milhões na cotação atual) em um atacante, uma fortuna para o início dos anos 1980.

Melhores momentos do jogador Justin Fashanu

O lendário técnico inglês dera a camisa 9 para o garoto de 19 anos. Mas Justin Fashanu, jogador que anos depois revelaria publicamente ser homossexual, não fazia gols.

“Se você quer comprar carne, vai ao açougue. Se quer pão, encontra na padaria. Então, por que vai a essas boates de pederastas?”, irritou-se o técnico, após ouvir diversos relatos de que seu comandado frequentava boates gays da pequena Nottingham. Clough, então, decidiu mandá-lo treinar afastado dos outros atletas do elenco profissional.

Fashanu foi o primeiro nome de uma liga de expressão a declarar sua homossexualidade enquanto ainda era profissional. Isso aconteceu em 1990, aos 29 anos. Já estava em final de carreira por causa de persistente lesão no joelho. Por 100 mil libras esterlinas (R$ 750 mil pela cotação atual), ele vendeu a entrevista na qual falou sobre o assunto para o tabloide The Sun.

Na semana passada, o jogador australiano Josh Cavallo se declarou gay em uma postagem nas redes sociais. Detonou uma avalanche de mensagens de apoio no mundo da bola. Mas entre as ligas mais importantes do planeta, Fashanu continua caso único.

Ele morreu aos 37 anos, em 1998. Enforcou-se na garagem de sua casa. Era procurado pela polícia dos Estados Unidos como suspeito no caso de estupro de um adolescente. No dia anterior, telefonou para Eric Hall, o agente que havia intermediado suas conversas com o The Sun, e deixou uma mensagem. Assegurava ter nova história que poderia vender ao diário.

Sua explosão no futebol aconteceu em 1980, aos 18 anos, quando atuava pelo Norwich e fez um gol contra o Liverpool tão bonito que acabou eleito pela BBC o melhor da temporada. Foi o que o levou ao Nottingham Forest, então uma força europeia, bicampeão do torneio hoje chamado de Champions League, a contratá-lo.

“Clough não gosta de mim”, confessou a amigos antes mesmo de ser afastado.

Estava certo. No livro “Provided You Don’t Kiss Me” (sem lançamento no Brasil), o autor Duncan Hamilton sinaliza que a principal fonte de exasperação do treinador com seu atacante era a falta de gols, não o fato de ser gay. Foram apenas três pelo clube.

A vida de Justin Fashanu foi repleta de rejeições. Entregue para adoção aos quatro anos junto com o irmão mais novo, John, cresceu criado por uma família de classe média. Os dois eram os únicos negros no bairro.

Talentoso e forte fisicamente, encontrou-se no futebol. Mas ele tinha um problema em campo. Não sabia se impor, era introvertido demais. Nas palavras de jogadores que atuaram com ele, o atacante era simpático, carismático, muito educado, mas essas características não garantiam nada com a bola rolando.

Isso nunca foi problema para seu irmão. John faria muito mais sucesso no esporte. Seria em 1988 campeão da Copa da Inglaterra com o Wimbledon. Um elenco tão cheio de histórias inacreditáveis que ficou eternizado pelo apelido The Crazy Gang (A turma maluca, na tradução do inglês).

Em viagens já como profissional, Justin assustava os colegas de elenco. Tinha pesadelos aterradores. Dava socos, quebrava janelas, esmurrava paredes e gritava enquanto dormia. Também tinha de aguentar as ofensas dos torcedores adversários. Justin Fashanu era um prato cheio para torcedores racistas e homofóbicos dos anos 1980.

“Eu ouvi muitas coisas por ser negro. Mas as ofensas que Justin teve de suportar… Sinceramente, não sei se aguentaria”, diz o lateral Viv Anderson, ex-companheiro de Fashanu no Forest.

Pouco depois de ser afastado no Forest, o Southampton se interessou pelo atacante. Foi uma bênção para ele e para Clough. Não deu certo. Liberado para o Notts County, sofreu pancada no joelho na primeira partida da temporada 1983/1984. Nunca mais foi o mesmo jogador. Peregrinou por outras equipes. Foi dispensado pelo Brighton, então na segunda divisão, em 1987, com o argumento de que não tinha mais condições físicas para ser jogador profissional.

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