Silêncio de nomes como Moro e Castro após condenação de Bolsonaro gera incômodo em aliados e expõe racha na direita

Ex-juiz da Lava-Jato chegou a ser cobrado publicamente por um dos filhos do ex-presidente

O presidente Jair Bolsonaro e o então ministro Sergio Moro, em 2019 – Jorge William/Agência O Globo

O GLOBO

A decisão do Tribunal Superior Eleitoral (TSE), na última sexta-feira, de tornar Jair Bolsonaro inelegível por oito anos expôs a falta de unidade em torno dele, embora o ex-presidente seja tratado como a principal liderança de direita no país. Aliados próximos não escondem o incômodo em relação ao silêncio de figuras como o senador Sergio Moro (União-PR) e o governador do Rio, Cláudio Castro (PL), diante da condenação do ex-titular do Palácio do Planalto por abuso de poder político e mau uso dos meios de comunicação.

Advogado de Bolsonaro e ex-secretário de Comunicação Social da Presidência, Fabio Wanjgarten tentou minimizar a falta de manifestações públicas de apoio de alguns aliados emblemáticos, sobretudo nas redes sociais.

— Os apoios privados são mais sinceros que públicos — afirmou Wajngarten.

Correligionário do ex-presidente, Cláudio Castro fez seu último aceno na véspera da condenação. Na ocasião, ele disse que a inelegibilidade de Bolsonaro aumentaria a sua relevância política. A tentativa de demonstrar apoio, no entanto, foi considerada “um equívoco” e “infeliz” pelo ex-titular do Planalto.

— (Bolsonaro será) talvez até mais importante do que se estivesse elegível. Não tenho dúvidas de que um candidato à Presidência que teve 49% (dos votos) tem uma infinidade de seguidores, que terão um sentimento de injustiça. Com certeza, (será) ainda melhor do que elegível, não tenho dúvida — disse Castro, no 22º Fórum Empresarial Lide.

Após a decisão do TSE, o governador não se pronunciou mais sobre o assunto.

Afastamento gradativo

O senador Romário (RJ), reeleito pelo mesmo partido do ex-presidente, também ignorou a condenação. Eles estão afastados desde que Bolsonaro anunciou apoio à candidatura de Daniel Silveira (PTB) ao Senado nas últimas eleições.

Governadores que estiveram no palanque com o ex-chefe do Planalto em 2022, como Ratinho Júnior (PSD), do Paraná, e Ronaldo Caiado (União Brasil), de Goiás, também não lhe prestaram solidariedade de forma pública. Ambos têm mantido distância segura de Bolsonaro e investido em um bom relacionamento com o governo do presidente Luiz Inácio Lula da Silva, como mostrou o GLOBO. A ideia é estreitar o diálogo para conquistar mais recursos para seus estados e cacifar seus aliados nos próximos pleitos.

No Congresso, a cobrança mais enfática é por um posicionamento público do ex-juiz e senador Sergio Moro. Ex-ministro da Justiça de Bolsonaro, ele saiu brigado do governo, mas se reconciliou durante a campanha do ano passado numa empreitada contra Lula.

O ex-juiz da Lava-Jato chegou a ser cobrado pelo próprio filho do ex-presidente, Carlos Bolsonaro (Republicanos-RJ). No domingo, o vereador carioca ironizou Moro ao responder a uma publicação de uma influenciadora que questionava o silêncio do senador.

“Alguma manifestação do Moro em relação à inelegibilidade de Bolsonaro?”, escreveu a bolsonarista. “Terceira via tá chamuscando a beirola”, respondeu o vereador. Procurado pelo GLOBO, Moro afirmou que não tem se pronunciado sobre a condenação do ex-presidente.

Já a sua mulher, a deputada federal Rosangela Moro (União-SP), assinou um projeto que visa a anistiar condenados em crimes eleitorais desde 2016. Ela, contudo, também não fez menção pública a Bolsonaro.

A postura de aliados menos radicais tem motivado críticas de “bolsonaristas raiz” no Parlamento:

— Uma das coisas que nós conservadores achamos muito importante é lealdade, existem muitas pessoas que usaram o nome de Bolsonaro para se eleger e num momento que ele foi considerado inelegível, viraram as costas. Isso incomoda a todos nós — disse a deputada federal Silvia Waiãpi (PL-AP).

Do núcleo bolsonarista do PL na Câmara — do qual fazem parte 66 deputados entre os 99 da legenda — seis não comentaram a condenação de Bolsonaro, segundo levantamento do GLOBO. Um deles é Eli Borges (TO), líder da bancada evangélica, um dos segmentos mais fiéis ao ex-presidente. Ferrenho defensor de pautas conservadoras, como a criminalização das drogas e do aborto, ele se absteve da defesa de Bolsonaro.

O deputado Bibo Nunes (PL-RS), autor de um projeto de lei que prevê a redução do tempo de inelegibilidade de oito para dois anos, afirma que “quem fica em silêncio, não tem direito a nada”.

— Eles se escondem — concluiu o parlamentar. — Essa decisão (do TSE) foi muito errada. A atitude (de Bolsonaro) era cabível de punição, mas jamais esta pena.

Nos bastidores, a avaliação é que a decisão da Corte Eleitoral já era esperada, o que enfraqueceu a repercussão da derrota. Na próxima quinta-feira, a bancada do PL se reunirá em Brasília para definirá os próximos passos da legenda.

Aliados do ex-presidente ficaram inconformados também com setores da direita que são contrários a Bolsonaro. Líderes do Movimento Brasil Livre, por exemplo, foram às redes celebrar a decisão do TSE, mesma Corte que havia sido criticada pelo MBL dias antes por cassar o mandato do deputado Deltan Dallagnol (Podemos-PR). Coordenadora do movimento, Amanda Vettorazzo afirmou que a inelegibilidade de Bolsonaro representa “um pequeno passo para a direita”.

A deputada Júlia Zanatta (PL-SC), do núcleo duro bolsonarista, reagiu no Instagram: “Olha a falsa direita aí”.

— Eles não são de direita. Essas pessoas, quando Bolsonaro estava no poder, tentavam destruir sua imagem, faziam palanque com sindicalista para derrubá-lo. Agora dizem que a direita foi libertada com a condenação do ex-presidente. Quem for por esse caminho, vai cair do cavalo mais uma vez — disse Zanatta.

Já o deputado Kim Kataguiri (União-SP) avaliou que haverá uma reconstrução da direita a partir da saída de Bolsonaro do jogo eleitoral:

— Politicamente, abre o campo para o Tarcísio (de Freitas, governador de São Paulo), que é o candidato mais forte.

Possíveis herdeiros

Tarcísio e Romeu Zema (Novo), governador de Minas, são apontados como dois possíveis herdeiros do espólio político de Bolsonaro, impedido de disputar um cargo público até 2030. Ontem, em entrevista ao programa Pânico, da Jovem Pan, o ex-presidente respondeu que ainda não tinha morrido quando questionado quem seria seu sucessor como representante da direita para as eleições de 2026:

— Eu tô na UTI, não morri ainda. Não é justo alguém querer dividir o meu espólio.

Quando questionado sobre qual seria sua “bala de prata”, que declarou ter para a próxima eleição presidencial, em entrevista ao jornal Folha de S.Paulo na semana passada, Bolsonaro disse não ver hoje alguém com conhecimento suficiente do país para substituí-lo.

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