Vacina da AstraZeneca contra Covid pode ter apresentado risco cardíaco maior para mulheres jovens

Segundo análise, esse público pode ter tido maior probabilidade de morrer nas 12 semanas após a vacinação

Enfermeira mostra ampola de vacina da AstraZeneca contra o Covid-19 na UBS Jardim Edite, na zona sul de São Paulo – Bruno Santos – 6.jul.22/Folhapres

Folha de São Paulo

As mulheres jovens que receberam pelo menos uma dose da vacina contra Covid-19 produzida pela AstraZeneca podem ter tido maior probabilidade de morrer de um problema cardíaco nas 12 semanas após a vacinação, segundo uma análise dos registros de imunização e óbito na Grã-Bretanha divulgada na última segunda-feira (27).

Essas conclusões incluem uma grande ressalva: a Grã-Bretanha suspendeu o uso da vacina AstraZeneca para pessoas com menos de 30 anos em abril de 2021, citando o risco de coágulos sanguíneos raros, mas perigosos. Naquela época, as jovens imunizadas eram principalmente profissionais de saúde ou clinicamente vulneráveis, porque as pessoas com alto risco de Covid por idade, saúde ou emprego eram vacinadas primeiro. Portanto, os resultados do estudo podem não se aplicar à população em geral.

“Talvez as pessoas extremamente vulneráveis do ponto de vista clínico sejam mais suscetíveis aos efeitos colaterais da vacina”, disse Vahé Nafilyan, estatístico sênior do Escritório Nacional de Estatísticas da Grã-Bretanha e um dos principais pesquisadores do estudo. Os resultados foram publicados na segunda-feira na revista Nature Communications.

A vacina AstraZeneca nunca foi autorizada para uso nos Estados Unidos.

A análise encontrou seis mortes relacionadas ao coração por 100 mil mulheres jovens que receberam pelo menos uma dose da vacina na Grã-Bretanha. Nessas mulheres, a morte relacionada ao coração foi 3,5 vezes mais provável nas 12 semanas após a vacinação do que após o período de 12 semanas. Coágulos que bloqueiam o fluxo sanguíneo podem causar ataque cardíaco ou derrame.

Os pesquisadores não encontraram um risco significativamente elevado de morte em nenhum outro subgrupo ou com a vacina de mRNA da Pfizer-BioNTech, que também foi amplamente utilizada na Grã-Bretanha. E o estudo não provou que as vacinas causaram as mortes.

Os benefícios das vacinas contra Covid ainda superam amplamente os riscos, e a incidência de eventos nocivos após a vacinação permanece muito baixa, enfatizaram os pesquisadores e outros especialistas.

Na análise, a Covid foi associada a uma morte adicional para cada 12 mil jovens não vacinados e uma morte adicional para cada 56 mil jovens vacinados.

“Quando você analisa os efeitos colaterais da vacinação, acho que é muito importante também ver os benefícios”, disse Nafilyan.

Os pesquisadores vincularam os registros de imunização a mortes por qualquer causa registradas em pessoas de 12 a 29 anos. Eles analisaram os dados a partir de 8 de dezembro de 2020, quando começou a vacinação na Grã-Bretanha.

Os dados de mortalidade vieram de duas fontes independentes: óbitos registrados até 8 de junho de 2022 e óbitos hospitalares até 31 de março de 2022.

A equipe encontrou um aumento muito pequeno nas mortes nas 12 semanas após a vacinação em homens jovens que receberam a vacina de mRNA, mas disse que a conclusão não foi estatisticamente significativa. Apenas mulheres jovens —pouco mais de 177 mil— que receberam uma dose da AstraZeneca tiveram um risco maior de morte.

A análise não liga conclusivamente as vacinas às mortes, alertaram os especialistas.

“É o suficiente para chamar minha atenção e dizer que devemos estudar mais isso”, disse Daniel Salmon, diretor do Instituto de Segurança de Vacinas da Escola de Saúde Pública Bloomberg da Universidade Johns Hopkins. Mas “eu não chegaria perto de tirar alguma conclusão causal”.

“Em geral, é bastante tranquilizador, mas destaca algumas vacinas e algumas populações que merecem um estudo mais aprofundado”, disse Salmon.

Outros estudos ligaram os efeitos colaterais da vacina a subgrupos específicos. Dados de vários países vinculam as vacinas de mRNA contra Covid a um risco elevado de miocardite e pericardite —inflamação do coração ou de seu revestimento externo—, principalmente em homens entre 12 e 29 anos.

Poucas semanas após sua introdução, a vacina AstraZeneca foi associada a um raro distúrbio de coagulação do sangue, principalmente em mulheres jovens, na Grã-Bretanha e em outros países da Europa. Embora a vacina da AstraZeneca não tenha obtido aprovação regulatória nos Estados Unidos, a Administração de Alimentos e Drogas (FDA) autorizou em dezembro de 2020 uma vacina semelhante feita pela Johnson.

Felizmente, à medida que cada vez mais desses dados são coletados e divulgados, podemos continuar com a certeza de que a taxa de efeitos colaterais graves —referidos como eventos adversos— é notavelmente baixa para ambos os tipos de vacinas

Susan Cheng

Cardiologista e pesquisadora de saúde pública do Smidt Heart Institute no Cedars Sinai

Em abril de 2021, a FDA pediu uma pausa no uso dessa vacina, após relatos de um distúrbio de coagulação do sangue em seis mulheres americanas. A agência retirou a pausa recomendada dez dias depois e alterou o rótulo da vacina para alertar sobre o risco.

Um ano depois, a FDA restringiu novamente o uso da vacina, dizendo que ela deveria ser oferecida apenas a pessoas que não poderiam ou não optariam por uma das vacinas de mRNA. Até então, a agência havia recebido relatos de 60 casos de distúrbio de coagulação e nove mortes, em 18 milhões de doses administradas.

“Felizmente, à medida que cada vez mais desses dados são coletados e divulgados, podemos continuar com a certeza de que a taxa de efeitos colaterais graves —referidos como eventos adversos— é notavelmente baixa para ambos os tipos de vacinas”, disse a doutora Susan Cheng, cardiologista e pesquisadora de saúde pública do Smidt Heart Institute no Cedars Sinai, em Los Angeles, sobre as vacinas de mRNA e não mRNA.

“Dito isso, embora as taxas desses eventos adversos permaneçam extremamente baixas”, disse ela, “são importantes e precisam ser contadas e analisadas para que possamos entendê-los melhor.”

Tradução de Luiz Roberto M. Gonçalves

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